Legi�o Urbana Uma Outra Esta��o
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"O que h� de errado comigo? Eu n�o sei de nada e continuo
limpo" Em suas letras o compositor falava abertamente dos
assuntos que preferia silenciar para toda a m�dia (Folha de S�o Paulo - 12/10/1996) (Por Pedro Alexandre Sanches) � irrelevante
que Renato Russo o mais sincero poeta roqueiro dos anos 80 no Brasil nunca tenha
vindo a p�blico revelar que tinha Aids, repetindo a experi�ncia de exposi��o
dolorosa � m�dia vivida por Cazuza. O l�der da Legi�o
Urbana nunca, em momento algum, escondeu de seu p�blico qualquer detalhe sobre
sua pr�pria vida. Assim, ele se
declarou homossexual desde o primeiro disco, em 1984, para qualquer bom
entendedor. Assim, pelo menos desde 1989, ele dava pistas abundantes de sua rela��o
com a doen�a, para qualquer bom entendedor. Ningu�m
entendeu porque do�a s� isso. Agora, vejamos.
Em junho de 1990, Renato declarou em p�blico que era predominantemente
homossexual. Foi novidade para todo mundo, mas n�o era novidade para ningu�m. Em "Ainda
� Cedo", do primeiro disco, o narrador descreve sua rela��o com a menina
que ensinou-lhe tudo que ele sabe, mas confessa: "Eu me agarrava a ela
porque eu n�o tinha mais ningu�m". "Soldados",
do mesmo disco, � mais expl�cita � o di�logo de amor e rivalidade entre dois
meninos brincando de soldados, enquanto suas meninas est�o longe. N�o basta?
"Daniel na Cova dos Le�es", do disco seguinte, � ainda mais expl�cita:
"Teu corpo � meu espelho e em ti navego". Ponto. O resto seria s�
desencana��o. Assim � na confiss�o de "Meninos e Meninas" (gosta
de meninas tamb�m, mas os meninos v�m primeiro); ou no disco solo abertamente
gay "The Stonewall Celebration Concert"; ou, no bate-papo
"Leila" (96), em que desabafa com a amiga a necessidade de um homem. Com as drogas, a
mesma coisa: em "Conex�o Amaz�nica" (87, mas composta muito antes),
a coca�na n�o chega; em "H� Tempos", a euforia qu�mica j�
diminuiu ("Parece coca�na, mas � s� tristeza"); em "L'�ge d'Or"
(91), ele nivela v�cios ("J� tentei muitas coisas, de hero�na a
Jesus"). Por fim, a Aids
ou a depress�o, ou ambas, ou uma delas causada pela outra. Pelo menos desde 89
Renato se refere intensamente a doen�a, a morte, a p�nico. Aos exemplos. Em 89: "H�
tempos s�o os jovens que adoecem", diz a letra de "H� Tempos";
em "Pais & Filhos": "� preciso amar as pessoas como se n�o
houvesse amanh�/ Porque se voc� parar pra pensar, na verdade n�o h�". Em 91, Russo vai
mais fundo. "Quando vejo o mar, existe algo que diz: A vida continua e se
entregar � uma bobagem", diz em "Vento no Litoral". Em "O
Descobrimento do Brasil" (93), frases soltas v�o compondo o mosaico:
"Esperan�a, teus len��is t�m cheiro de doen�a"; "O que h�
de errado comigo? Eu n�o sei de nada e continuo limpo"; "Olhe nos
meus olhos, sou o Homem-Tocha", "Viver � foda, morrer � dif�cil",
e assim por diante. Agora, em 96, a
tempestade se deu, e todo mundo viu. O �ltimo disco da Legi�o Urbana � um
tratado de morte, do come�o ao fim. Veja-se a ep�grafe
do encarte, assinada por Oswald de Andrade: "O Brasil � uma rep�blica
federativa cheia de �rvores e gente dizendo adeus". Renato Russo se
despede. "A
Tempestade" abre com um an�ncio: "Vamos falar de pesticidas/ E de
trag�dias radioativas/ De doen�as incur�veis (...)/ Ter esperan�a �
hipocrisia/ A felicidade � uma mentira/ E a mentira � salva��o/ Beba desse
sangue imundo". A seguir, os
fatos s�o postos na mesa: "Quando acreditei que tudo era um fato
consumado/ Veio a foice e jogou-te longe/ Longe do meu lado" (mostrando que
sua morte n�o foi a �nica); "Vem de repente um anjo triste perto de mim/
E essa febre que n�o passa". Por fim, o
narrador suplica, explicitamente, pelo descanso: "Meu cora��o n�o quer
deixar meu corpo descansar". N�o venham
reclamar da covardia de Renato em falar sobre seu estado de sa�de. Ela n�o
houve. Antes de morrer, ele fez quest�o de deixar, para legi�es e legi�es de
f�s adolescentes, o mais sombrio testamento que p�de redigir os adolescentes
que se virem, ora em diante. E coragem nunca lhe faltou. |
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Skooter 1998 - 2008 |
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