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Reportagens
/ Entrevistas
Venda de
discos de Renato Russo dobra em SP
19h03 - 11/10/1996
S�O
PAULO, SP (Ag�ncia Folha) - A morte de Renato Russo
duplicou a venda de discos do m�sico e da banda Legi�o
Urbana hoje, em S�o Paulo. Francisco Nolberto Lucas,
gerente da Planet Music Mega Store, maior loja de discos
da cidade, disse que a procura aumentou da mesma forma
que depois da morte dos integrantes do grupo Mamonas
Assassinas. Funcion�rios das lojas Musical Box, Aqualang
e Hi-Fi Laser disseram que a vendagem dos discos de
Renato Russo e do Legi�o Urbana foi 50% maior. Os
trabalhos mais procurados, segundo os lojistas, s�o os
discos ''Equil�brio Distante'' (trabalho solo com
m�sicas italianas), ''Dois'' e ''A Tempestade'' (disco
mais recente do Legi�o Urbana). O cantor e compositor
Renato Russo, ou Renato Manfredini Jr., nasceu no Rio em
27 de mar�o de 1960, abandonou o jornalismo e a
profiss�o de professor de ingl�s para se tornar
vocalista da banda Aborto El�trico, em 1978. A banda
teve vida curta. Com os amigos Dado Villa-Lobos e Marcelo
Bonf�, criou ent�o o Legi�o Urbana. O primeiro disco
foi lan�ado em 1984, e teve sucesso relativo. O grupo
estourou com o segundo �lbum, ''Dois'', em 1986. �
desse disco a m�sica ''Eduardo e M�nica''. O �ltimo
disco, ''A Tempestade ou O Livro dos Dias'', foi lan�ado
no m�s passado, sem divulga��o para a imprensa.
Segundo o grupo, ''o disco fala por si''. Em 12 anos de
carreira, o grupo contabilizou mais de 4,5 milh�es de
discos vendidos.
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M�e diz
que Renato Russo desistiu de viver
12h44 - 12/10/1996
RIO
DE JANEIRO, RJ (Ag�ncia Folha) - A m�e de Renato Russo,
Maria do Carmo Manfredini, disse hoje de manh�, depois
da missa de corpo presente de seu filho, que ele ''quis
chegar ao fim''. ''N�o se suicidou, mas simplesmente
n�o lutou'', afirmou. Apesar de o m�dico do m�sico, o
cl�nico-geral Saul Bteshe, ter afirmado ontem que Russo
morreu em consequ�ncia de Aids, Maria do Carmo disse que
foi anorexia nervosa (doen�a que causa perda do apetite)
a causa da morte. Bteshe, que assinou o atestado de
�bito de Russo, informou que o cantor e compositor tinha
o v�rus HIV havia seis anos. Segundo Maria do Carmo
Manfredini, nos �ltimos dias, Russo vivia um ''per�odo
muito grande de depress�o. Realmente n�o queria mais
viver. Sabe, ele foi se entregando. Ele achava que n�o
tinha mais nada''. Ela afirmou que o compositor estava em
crise desde o in�cio do ano. ''O nome 'A Tempestade ou O
Livro dos Dias' (�ltimo disco da banda, lan�ado em
setembro) foi escolhido justamente por causa disso,
porque havia uma tempestade dentro dele. O dever
profissional dele era muito forte. Ele me disse que
queria deixar esse disco porque n�o sabia se faria
outro'', afirmou.
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Gravadora
diz que Russo deixa material in�dito
12h56 - 12/10/1996
RIO
DE JANEIRO, RJ (Ag�ncia Folha) - O presidente da
gravadora EMI, Alo�sio Reis, disse que o grupo Legi�o
Urbana tem muito material in�dito gravado com a
participa��o de Renato Russo. Segundo ele, uma reuni�o
com os demais participantes do grupo, provavelmente daqui
a duas semanas, definir� o que ser� feito com esse
material ''Todo grupo de rock sempre tem material
gravado. No caso do Legi�o Urbana, esse material �
relativamente grande'', disse Reis. ''At� agora n�o
tivemos tempo de pensar, s� de chorar'', afirmou. O
Legi�o Urbana � contratado da EMI desde 1984 e lan�ou
todos os seus discos pela gravadora. Segundo Reis, o
�ltimo disco do grupo, ''A Tempestade ou O Livro dos
Dias'' foi lan�ado com uma prensagem de 340 mil c�pias,
a maior tiragem inicial de um disco do grupo. Com a morte
de Renato Russo, a EMI perdeu seu segundo integrante do
time de l�deres de vendagem em menos de um ano. O
primeiro foi o grupo Mamonas Assassinas, cujos
integrantes morreram no dia 2 de mar�o deste ano, em
acidente de avi�o.
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Corpo de
Renato Russo � cremado no Rio
12h35 - 12/10/1996
RIO
DE JANEIRO, RJ (Ag�ncia Folha) - Em uma cerim�nia
simples, como era o desejo do cantor e compositor Renato
Manfredini J�nior, o Renato Russo, 36, o corpo do
artista foi cremado na manh� de hoje no cemit�rio S�o
Francisco Xavier, no Caju (zona portu�ria do Rio).
Poucos familiares e amigos compareceram ao cerimonial de
crema��o do corpo de Russo, dentre eles os pais, Renato
e Maria do Carmo Manfredini, e os artistas Marina Lima e
Marco Nanini. O guitarrista Dado Villa-Lobos e o
baterista Marcelo Bonf�, que formavam com Russo o
n�cleo central do grupo Legi�o Urbana, n�o
compareceram ao cerimonial. ''Estou muito triste, foi uma
perda profunda'', disse Marina. Maria do Carmo Manfredini
disse que as cinzas do corpo de Russo ser�o jogadas em
um jardim florido. A crema��o do corpo come�ou �s 9h.
�s 9h45, a administra��o do cremat�rio liberou a
entrada dos f�s, ap�s a sa�da dos familiares.
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Texto
escrito por Renato Russo em abril
de 1983 para o primeiro grande show
Estado - 11/10/1996
Os
componentes dos quatro conjuntos fazem parte do que era
conhecido como "a turma da colina da UnB", isso
por volta de 1977, �poca da abertura e da
redemocratiza��o (embora a UnB ainda apresentasse
alguns problemas). Um ma�o do Hollywood estava por volta
de Cr$ 15,00 e, na cidade, n�o existia nada para se
fazer. Mas aparece ent�o o que iria acabar de vez com a
pouca identidade que a capital tinha com a m�sica
discoteca. Bras�lia deixa de ser Bras�lia e passa a ser
Rio de Janeiro, como o Pa�s inteiro. Para quem gostava
de rock, esse foi o fim. Basta ser chamado de colonizado
o tempo todo; com a moda disco a situa��o piora
sensivelmente. Ainda mais porque na mesma �poca aparece
um movimento original e an�rquico que pretende acabar
com os falsos modismos. � a moda levada ao extremo:
antimoda, antiest�tica, antitudo. Mas aqui � bem mais
f�cil controlar a juventude oferecendo a v�lvula de
escape ideal e n�o uma m�sica que fa�a todos pensarem
e questionarem as hipocrisias construtivas de uma
sociedade falsa, � beira da autodestrui��o at�mica.
Ha-ha. M�sica discoteca n�o fala desse feito. E a
m�sica popular brasileira parece estar mais preocupada
com cama e mesa e a sensa��o das cordilheiras. E o
pessoal que faz letras espertas n�o gosta de tocar rock
no Brasil. O que fazer? Ser� que est�o todos
satisfeitos? Rock � uma atitude, n�o � moda. �
m�sica da �frica. N�o � m�sica americana. Tem no
mundo inteiro. Texto escrito por Renato Russo em abril de
1983 para o primeiro grande show reunindo as quatro
principais bandas de Bras�lia: Legi�o Urbana, Plebe
Rude, Capital Inicial e XXX.
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Renato
captou esp�rito da gera��o
criada debaixo do militarismo
Estado - 11/10/1996
O
rock brasileiro perdeu seu maior poeta. Renato Russo,
vocalista e compositor da Legi�o Urbana, captou o
esp�rito de toda a blank generation criada sob as botas
do militarismo p�s-64. "Somos burgueses sem
religi�o, somos o futuro da na��o: gera��o
Coca-Cola," vociferava no primeiro disco da banda,
em 1984, quando o Brasil retomava os caminhos da
democracia. Aos 36 anos, Russo andava deprimido havia
muito tempo. Pol�mico e controverso, Russo foi punk,
definiu seu grupo de rock como filhos da revolu��o e
nos �ltimos anos adotou uma posi��o aberta em
rela��o a sua condi��o de homossexual sem fazer disso
uma bandeira. Ao lado de Dado Villa Lobos e Marcelo
Bonf�, Russo foi o respons�vel pela inser��o de
Bras�lia no panorama do rock nacional. Aberta a porta
pela Legi�o, outros grupos como Detrito Federal, Plebe
Rude e Capital Inicial atingiram os ouvidos das novas
gera��es brasileiras na metade dos anos 80. Todos eram
muito zangados. Bras�lia foi amada e odiada por Renato
Russo. Foi na capital do Brasil que ele desenvolveu seu
rock e forjou a f�ria e o sarcasmo de seus versos bem
constru�dos. Foi em Bras�lia, em 1988, que ele foi
execrado pela cidade que criou o rock da Legi�o Urbana.
Um show da banda no est�dio Pelez�o, em junho de 1988,
marcou para sempre a trajet�ria da banda. Um f� invadiu
o palco e come�ou a agredir Russo. Foi o estopim de uma
noite infernal. No final, 385 feridos e um discurso
inflamado de Russo prometendo nunca mais tocar em
Bras�lia. O epis�dio foi classificado como uma esp�cie
de Altamont brasileiro, refer�ncia a um concerto dos
Rolling Stones em dezembro de 1969 que quase acabou em
trag�dia. Clone vocal de um �dolo da Jovem Guarda,
Jerry Adriani, Russo deu a volta por cima nessa armadilha
do destino. E fez o caminho pelo avesso: se Jerry
come�ou cantando em italiano, Russo acabou a carreira
com um disco solo na l�ngua de Dante. Deprimido
cr�nico, dependente confesso de �lcool e coca�na,
Russo sempre atraiu a aten��o dos rep�rteres, fosse
pelo h�bito de quase n�o falar � imprensa ou pela
torrente de declara��es bomb�sticas que flu�a quando
ele resolvia abrir a boca.
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Renato
segundo seus amigos
Estado - 11/10/1996
"Era
um idealista", diz Roger Moreira, do Ultraje
Amigos, colegas e vizinhos se
manifestaram sobre a morte de Renato Russo. A seguir,
alguns dos depoimentos sobre o cantor.
Nota oficial da gravadora da Legi�o Urbana, EMI-Odeon
"Lamentamos profundamente a morte ocorrida nesta
madrugada do nosso querido Renato Russo, cuja mem�ria
permanecer� viva na lembran�a do povo perpetuada que
est� em seu inesgot�vel talento e na beleza de suas
obras e interpreta��es, que tivemos o privil�gio de
fixar para a eternidade. Mais do que um extraordin�rio
artista, perdemos um grande companheiro e amigo. Que
Renato Russo descanse em paz."
Roger
Moreira, vocalista do Ultraje a Rigor "Estou
chocado. O Renato era um cara de um carisma
impressionante, um idealista. Admirava tamb�m o seu
car�ter - nunca precisou se vender ao sistema para fazer
sucesso. Ele viveu pra dizer o que pensava."
Edgar Scandurra, guitarrista do IRA!
"O Ira e o Legi�o come�aram a carreira juntos, em
1977. A gente com o nome de Sub�rbio e eles como Aborto
El�trico. A gente tocava nos mesmo lugares aqui em S�o
Paulo - Rose Bom Bom, Radar Tam Tam, Napalm. Era todo
mundo adolescente na �poca, lembro dele me presenteando
com um disco do Small Faces, com uma dedicat�ria
super-carinhosa. Me dava muito bem com o Renato."
Marina Lima, cantora "N�s fizemos um
grupo de estudos de filosofia juntos. Mas n�o posso
dizer que era �ntima dele, seria uma blasf�mia. O
Renato era uma pessoa muito cerimoniosa. Acho uma perda
enorme para a m�sica brasileira, ele tinha um talento
�mpar. Para minha gera��o em particular � uma perda
terr�vel, igual � do Cazuza. Fica um vazio enorme, um
sentimento amargo de incompreens�o desse tempo em que
vivo."
Carlos Trilha, tecladista (tocou em todas
as faixas do �ltimo disco do Legi�o, A Tempestade)
"Renato sempre foi muito triste e sozinho, mas nos
�ltimos tr�s meses, se isolou completamente."
Francisca Maria da Silva, 50 anos (vizinha
de Renato Russo) "Gostava muito de ouvir ele tocar
teclado. Ele costumava tocar Brasileirinho, Asa Branca e
Pais e Filhos, uma m�sica que me marcou muito. H� tr�s
semanas, parei de ouvir o teclado e achei que ele tivesse
viajado. O relacionamento dele com os vizinhos era por
meio das m�sicas que sa�am de seu apartamento."
Lulu Santos, cantor e guitarrista
"Estou muito chocado para falar a respeito"
Toni Garrido, vocalista do Cidade Negra
"O Cidade Negra sempre fez reggae, mas mesmo assim a
gente foi muito influenciado pelas letras dele. O Renato
era um �dolo para todo mundo da nossa gera��o. Eu
ficava tremendo toda vez que era apresentado a ele."
Roberto Dranoff, da Red Hot Organization
"Passei anos tocando Legi�o na Jovem Pan. Chegamos
a pensar em convid�-lo para entrar no projeto do Red Hot
and Rio. Para mim, ele e o Arnaldo Antunes s�o os
melhores do Brasil."
Carlos Maltz, baterista da banda ga�cha
Engenheiros do Hawaii "Renato Russo foi o maior
cantor de minha gera��o, e eu comecei a tocar imitando
o Legi�o Urbana. Espero que agora ele encontre o seu
caminho."
Fernanda Takai, vocalista da banda mineira
Pato Fu "� um epis�dio muito triste, n�o h� como
medir a perda de um artista assim. A pesar de atitudes de
n�o querer dar entrevistas ou mesmo fazer shows, Renato
Russo era adorado pelos f�s: para ele, suas palavras
valiam ouro. Com o tempo, a gente vai sentir o peso de
sua morte para a hist�ria do rock brasileiro."
Casc�o, vocalista da banda Detrito Federal
"� completa a influ�ncia que ele teve sobre mim.
Bras�lia tinha uma cara administrativa e ele foi o
estopim que mostrou a cara jovem dela. A influ�ncia dele
no som da minha banda, Detrito Federal, tamb�m foi
gigantesco. Quando ouvi o Aborto El�trico (primeira
banda de Renato) pensei: � isso que eu quero fazer. E o
lema da �poca era o do it yourself, ent�o fui atr�s de
uma banda. Pode-se dizer que o Renato Russo � o nosso
JK, o que o Juscelino Kubitschek foi para Bras�lia o
Renato foi para a juventude dela."
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Corpo do
m�sico ser� cremado
Estado - 11/10/1996
RIO - O cantor e
compositor Renato Russo, de 36 anos, vocalista da banda
Legi�o Urbana, morreu � 1h15 de sexta-feira, em sua
casa, em Ipanema, Zona Sul. Seu corpo ser� cremado neste
s�bado, �s 9 horas, no Cemit�rio S�o Francisco
Xavier, no Caju, Zona Norte. De acordo com o atestado de
�bito, assinado pelos m�dicos Saul Pteshe e Humberto
Mauro R. L. Vasconcelos, sua morte foi causada por
septicemia, broncopneumonia e infec��o urin�ria. Ele
tinha Aids havia seus anos. Parentes e amigos de Renato
Russo (o nome art�stico de Renato Manfredini Jr.) n�o
confirmaram. "Est� todo mundo falando isso, mas �
uma coisa que ele n�o falava", disse Fernanda
Villa-Lobos, mulher do guitarrista da Legi�o, Dado
Villa-Lobos. "N�o cabe a mim comentar." Ela
afastou a hip�tese de Renato Russo ter-se suicidado.
"Ele n�o teria coragem." O cantor estava
deprimido havia v�rios dias, recusando-se a comer e a
sair de seu quarto, segundo parentes. "Ele estava
muito triste e falava em morte at� nas suas
m�sicas", disse Asmar Manfredini, tio de Renato.
Segundo Fernanda, o cantor estava anor�xico e an�mico.
A prima de Russo, Leisa do Esp�rito Santo Manfredini,
tamb�m negou a hip�tese de suic�dio: "Ele estava
com pneumonia." Suic�dio - O boato de que o cantor
havia se matado circulou no Rio h� tr�s dias e chegou a
ser noticiado em algumas r�dios. Informado sobre isso, o
diretor-art�stico da EMI, Jo�o Augusto, ligou
imediatamente para a casa do cantor e obteve not�cias de
que ele estava bem. Fernanda contou que, na ocasi�o,
Dado Villa-Lobos foi � casa do parceiro para saber o que
havia ocorrido. O guitarrista conversou com o pai do
cantor, o funcion�rio p�blico Renato Manfredini, e
ficou preocupado com a situa��o do amigo. Ele contou a
Dado que seu filho n�o comia havia v�rios dias e se
recusava a sair do quarto. "Dado, ent�o, conversou
com Renato, que chorou muito, demonstrando estar
realmente deprimido", contou Fernanda. "N�o
sab�amos que a situa��o era t�o grave." A
depress�o profunda de Renato Russo � confirmada por
seus vizinhos, amigos e parentes. "Ele andava muito
triste", disse a prima Leisa. "H� 15 dias ele
estava cabisbaixo, triste e deprimido", contou o
vizinho e amigo do cantor, Chico Guarani. O amigo lembrou
ainda que quando estava bem, Renato ouvia som em um
volume muito alto. "H� dois meses n�o se escuta
m�sica por aqui." Doen�a - Uma equipe de
enfermagem acompanhava o estado de sa�de de Renato Russo
em casa, desde que ele come�ou a ter crises de
pneumonia. "Ele nunca quis se hospitalizar",
contou o tio do cantor, Asmar Manfredini. De acordo com
vizinhos, Renato Russo se submetia a um tratamento de
desintoxica��o de drogas. O cantor j� havia declarado
em entrevistas que era dependente de coca�na e de
�lcool desde os 16 anos de idade. Na hora da morte,
Renato Russo estava no quarto de seu apartamento
conjugado, acompanhado de um enfermeiro e de seu pai, que
veio de Bras�lia h� um m�s para cuidar dele. A m�e do
cantor, Carmem Manfredini, chegou neste s�bado de manh�
� cidade. Renato Russo deixa um filho, Giuliano
Manfredini, de 7 anos, que tamb�m est� no Rio, na casa
dos bisav�s. Diversos amigos do cantor estiveram
sexta-feira em seu apartamento, entre eles, a vocalista
do conjunto Sex Beatles, Chris Broun, o fot�grafo
Fl�vio Colker, que fez diversas capas do disco da banda,
e o ator Maur�cio Branco. Nenhum deles quis comentar a
morte do cantor. Diversos f�s de Renato Russo fizeram
vig�lia durante todo o dia de sexta-feira em frente da
casa do cantor. Eles chegaram a agredir verbalmente os
jornalistas, dizendo que Renato jamais aprovaria tal
ass�dio da imprensa.
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Hist�ria
do cantor era de morte anunciada
Estado - 11/10/1996
ALEX
ANTUNES
Antes do fim de 83, um trio brasiliense come�ou a
aparecer em S�o Paulo, para tocar no Napalm e em outras
casas underground. Era a Legi�o Urbana, apenas mais uma
banda p�s-punk - el�trica, direta, r�pida, compacta,
barulhenta. E, no entanto, uma certa... intensidade?
sinceridade? credibilidade? j� emanava dos caras, em
especial do feioso vocalista e baixista, um certo Renato
Russo (pseud�nimo), com pendor para letras mais, eh,
liter�rias (sorry) do que a m�dia. O povo das bandas
paulistas o seguia, esp�cie de f�s num ambiente onde
n�o os havia. Eu era um desses. Nos dez anos seguintes,
encontrei a Legi�o in�meras vezes - o grupo de
popstars, eu como jornalista. Escrevi mil vezes sobre
eles; hoje, vendo a cara do Renato Russo na televis�o,
s� posso admitir que eu mesmo nunca entendi nada. Russo
congelado para sempre como uma esp�cie de enigma -
sempre pr�ximo (como no come�o), sempre distante (como
no final), ridiculamente transparente, rigorosamente
inexpugn�vel. A hist�ria de Renato Russo � a de uma
morte anunciada - n�s o pegamos para Cristo (e como ele
gostou disso!). Outro dia, conversando com Skowa, ele
falava no "poder" do artista em cima de um
palco. Propus-lhe um ponto de vista diferente, o do vudu:
entre o gal� e a fanzoca, quem � que recorta, fura e
prega a imagem de quem, no caderno ou na parede? Quem �
que se exp�e nas luzes, quem � que esconde o rosto nas
sombras? Quem � que engole quem, quem � escravo de
quem? Renato Russo era escravo dessa id�ia, dessa
hist�ria. Uma sensibilidade especial para o drama
pequeno e mortal, o foco menor e o mais intenso. Espelho
- Algu�m an�nimo o p�ra no corredor do Shopping da
G�vea e, agressivamente, pergunta: "Quem te deu o
direito de ficar espalhando o que acontece na minha vida
na tua m�sica (Ainda � Cedo)?" Essa era a vida do
Russo, no espelho do espelho. Ele tentou quebrar o
encanto, assumindo o lado messias: em um �nico show, foi
capaz de discursar seguidamente contra a fraude nos
vestibulares, o servi�o militar obrigat�rio, os
cambistas de ingressos e as elei��es indiretas. Ou
ent�o tentou assumir o entertainer: fez queimar fogos de
artif�cio ao som de Rhapsody In Blue, em outro ano, em
outra apresenta��o. Para o p�blico, era a mesma coisa:
era ele!, Renato Russo. S� ele n�o sabia quem era, s�
ele n�o aceitava o jogo (como Kurt Cobain). E ainda
esperava um gesto, um sinal do p�blico an�nimo, amorfo
e ensandecido (Russo quase causou uma cat�strofe por
insistir em tocar em est�dio sem impor o fosso entre o
palco e a plat�ia). Talvez tivesse escr�pulos demais
("N�o vou fazer o equivalente sonoro das fotos de
Robert Mapplethorpe"), o outro nome para a covardia.
Talvez procurasse um sentido que simplesmente n�o existe
(organizava seus 2 mil discos por ordem... de
prefer�ncia!). Morreu enquanto dorm�amos. Continuaremos
dormindo.
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Doente,
artista evitava aparecer em p�blico
Estado - 11/10/1996
Desde que seu clipe de Strani Amori estreou na MTV que
Renato Russo vinha evitando apari��es p�blicas. Nada
de fotos, releases ou declara��es p�blicas. No
entanto, furou o sil�ncio em julho, em uma entrevista
publicada h� poucas semanas no Zap!, por conta do
lan�amento do mais recente disco da Legi�o Urbana, A
Tempestade ou O Livro dos Dias. "Gravamos 25
can��es, mas da� nos tocamos da inviabilidade de, num
�ltimo disco de um contrato, lan�ar um �lbum
duplo." Dessa forma, a banda cortou dez can��es
j� prontas, o que pode fazer com que os f�s esperem
para os pr�ximos anos um novo �lbum do trio. Apesar de
quase nunca se encontrarem fora dos est�dios, os tr�s
integrantes do grupo tinham suas "formulinhas"
e compunham com aparente facilidade. Ainda h� muitos
tapes in�ditos das sess�es dos outros discos tamb�m.
Viol�ncia - N�o era segredo que Renato odiava se
apresentar em shows ao vivo, principalmente depois dos
problemas de viol�ncia na plat�ia durante a turn� de
As Quatro Esta��es, em 1989/1990. "A gente
percebeu que era imposs�vel insistir naquela coisa de
`tocar de igual para igual' com o p�blico, aquela coisa
de o p�blico ser igual a gente." No entanto, Renato
achava que a quest�o da viol�ncia na plat�ia j�
estivesse contornada, mas ainda havia coisas a ser
acertadas. "A gente pretende voltar a tocar, em
palcos altos e lugares grandes, assim que passar todos
esses meus problemas". Quais? N�o quis revelar.
"Mas estou me tratando com meus rem�dios e fazendo
an�lise." Renato era um po�o de obscurantismo,
monossil�bico, que se protegia atr�s de um falso ar
blas�. Tossia muito e interrompia a entrevista v�rias
vezes para que seu renitente solu�o passasse. Ali�s,
n�o tem uma pessoa que tenha encontrado Russo nos
�ltimos tempos que n�o o visse doente, gripado,
solu�ante ou profundamente deprimido, o que intensificou
os boatos a respeito de seu estado de sa�de. Russo era a
figura mais err�tica de sua gera��o, a do rock
brasileiro dos anos 80 e sua morte, ainda que
lament�vel, n�o chega a ser surpresa para quem
acompanha os passos do cantor desde o come�o. Renato
parecia acreditar (mesmo que sua lucidez o for�asse a
negar veementemente) na tradicional lenga-lenga sobre
"m�rtires" do rock. Her�is que partem em uma
infec��o pulmonar, como ele, em uma overdose, como
Keith Moon, ou num suic�dio, como Kurt Cobain, sempre
sabem que est�o trocando suas vidas por um lugar na
hist�ria. Uma barganha n�o muito lucrativa, diga-se.
Cobain, por sinal, era um dos casos recentes que mais
perturbavam Renato. "O Nirvana est� naquela
linhagem indispens�vel da hist�ria do rock, como Elvis,
os Beatles e o Sex Pistols", disse ele. "E eu
ficava muito aborrecido com aquele menino, porque eu me
via no lugar dele, vivendo a minha hist�ria",
contou, antes de concluir: "Eu tinha tudo para
morrer como ele."
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Corpo
ser� cremado
Estado - 10/10/1996
O cantor e compositor Renato Russo, de 36 anos,
vocalista da banda Legi�o Urbana, morreu � 1h15 da
madrugada desta sexta-feira em sua casa, em Ipanema, na
Zona Sul da cidade. Seu corpo ser� cremado neste
s�bado, �s 9h30m, no Cemit�rio S�o Francisco Xavier,
no Caju, na Zona Norte. De acordo com nota oficial
divulgada por integrantes do grupo, o cantor "morreu
em decorr�ncia de problemas infecciosos
pulmonares". Parentes e amigos do cantor disseram
que Renato Russo estava deprimido havia v�rios dias,
recusando-se a comer e a sair de seu quarto. "Ele
estava muito triste e falava em morte at� nas suas
m�sicas", disse Asmar Manfredini, tio do cantor.
Parentes e amigos de Renato Russo n�o confirmaram que o
cantor estivesse com Aids. "Est� todo mundo falando
isso, mas � uma coisa que ele n�o falava", disse
Fernanda Villa-Lobos, mulher do guitarrista do Legi�o,
Dado Villa-Lobos. "N�o cabe a mim comentar".
Ela afastou a hip�tese de Renato Russo ter-se suicidado.
"Ele n�o teria coragem", afirmou. Segundo
Fernanda, o cantor estava anor�xico e an�mico. A prima
do cantor, Leisa do Esp�rito Santo Manfredini, tamb�m
negou que ele tenha se suicidado. "Ele estava com
pneumonia", disse. Suic�dio - O boato de que o
cantor havia se matado circulou no Rio h� tr�s dias e
chegou a ser noticiado em algumas r�dios. Informado
sobre o boato, o diretor art�stico da EMI, Jo�o
Augusto, ligou imediatamente para a casa do cantor e teve
not�cias de que ele estava bem. Fernanda contou que, na
ocasi�o, Dado Villa-Lobos foi � casa do parceiro para
saber o que havia acontecido. O guitarrista conversou com
o pai do cantor, o funcion�rio p�blico Renato
Manfredini, e ficou preocupado com a situa��o do amigo.
Ele contou a Dado que seu filho n�o comia havia varios
dias e se recusava a sair do quarto. "Dado, ent�o,
conversou com Renato, que chorou muito, demonstrando
estar realmente deprimido", contou Fernanda.
"N�o sab�amos que a situa��o era t�o
grave". A depress�o profunda de Renato Russo �
confirmada por seus vizinhos, amigos e parentes.
"Ele andava muito triste", disse a prima Leisa.
"H� 15 dias ele andava cabisbaixo, triste e
deprimido", contou o vizinho e amigo do cantor,
Chico Guarani. O amigo lembrou ainda que quando estava
bem, Renato ouvia som em um volume muito alto. "H�
dois meses n�o se escuta m�sica por aqui." Doen�a
- Uma equipe de enfermagem acompanhava o estado de sa�de
de Renato Russo em casa, desde que ele come�ou a ter
crises de pneumonia. "Ele nunca quis se
hospitalizar", contou o tio do cantor, Asmar
Manfredini. De acordo com alguns vizinhos, Renato Russo
estava sendo submetido a um tratamento de
desintoxica��o de drogas. O cantor j� havia declarado
em entrevistas que era dependente de coca�na e
alco�latra desde os 16 anos de idade. Na hora da morte,
Renato Russo estava no quarto de seu apartamento
conjugado, acompanhado de um enfermeiro e de seu pai, que
veio de Bras�lia h� um m�s para cuidar dele. A m�e do
cantor, Carmem Manfredini, chegou hoje de manh� �
cidade. Renato Russo deixa um filho, Giuliano Manfredini,
de 7 anos, que tamb�m est� no Rio, na casa dos
bisav�s, na Ilha do Governador. Diversos amigos do
cantor estiveram em seu apartamento, entre eles, a
vocalista do conjunto Sex Beatles, Chris Broun, o
fot�grafo Fl�vio Colker, que fez diversas capas do
disco da banda, e o ator Maur�cio Branco. Nenhum deles
quis comentar a morte do cantor. Diversos f�s de Renato
Russo fizeram vig�lia durante todo o dia em frente �
casa do cantor. Eles chegaram a agredir verbalmente os
jornalistas, dizendo que Renato jamais aprovaria tal
ass�dio da imprensa.
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Renato
Russo d� voz para sua gera��o
Estado - 15/12/1995
O trabalho do vocalista, letrista e compositor da
Legi�o Urbana supera a nostalgia dos anos 80
GABRIEL BASTOS JUNIOR
Ad�cada de 80 foi marcada pelo auge do rock brasileiro,
que entrou definitivamente para o universo da m�sica
popular produzida no Pa�s. Muita coisa ficou para tr�s
e j� �, em t�o pouco tempo, motivo para nostalgia
(vide a volta com sucesso da Blitz). Do que ficou, um
nome se destaca como o letrista que melhor cantou essa
gera��o: Renato Russo, de 35 anos. Neste fim de ano,
ele se exp�e de maneira dupla - em Equil�brio Distante,
seu segundo disco solo, e na caixa com os seis discos de
est�dio da Legi�o Urbana remasterizados (nas lojas na
semana que vem), ambos pela EMI. O vocalista, letrista e
compositor da Legi�o, a banda de maior sucesso na
hist�ria do rock brasileiro, vive entre a conclama��o
de p�blico e classe art�stica e as alfinetadas da
imprensa, que o acusa de ultrapassado e at� de
"rock mauricinho", o que explica o tempo que
ele passa em cada entrevista falando das sandices
escritas a seu respeito. Mas j� � tempo de se admitir -
como fazem Lob�o, C�ssia Eller, Boca Livre, Marina e
tantos outros - que, como Cazuza, Russo � um nome
importante, com o mesmo peso para a sua gera��o que
t�m Caetano e Gil para a anterior. Compara��es
musicais s�o injustas, porque a proposta da Legi�o
nunca foi ter uma produ��o complexa, sofisticada ou
experimental nesse sentido. "Nossas m�sica s�o
duas notas", ironiza o pr�prio Russo. Mas sua
capacidade l�rica � incontest�vel quando se l� com
aten��o Acrilic on Canvas, por exemplo, do elogiado
disco Dois. "Minha gera��o sempre foi tachada de
vazia e idiota", comenta. A chance de provar que
isso n�o era verdade sempre foi um incentivo para
escrever as coisas com cuidado. "Eu n�o podia fazer
uma besteira." Agora Renato Russo enfrenta o desafio
de mostrar que, embora seja um cantor intuitivo (sem
t�cnica), pode se sair bem como int�rprete e produtor,
cuidando minuciosamente de todas as fases - at� da
produ��o gr�fica - de Equil�brio Distante. Com esse
disco rom�ntico, assumidamente brega e todo cantado em
italiano - com faixas que v�o de Laura Pausini (leia
entrevista com a cantora na p�gina 2) � vers�o de Como
uma Onda -, ele pretende experimentar o m�ximo da
absor��o na cultura pop, sem misturar com o seu
trabalho na Legi�o, que est� preparando novo disco.
At� l� vai se ouvir falar muito dele.
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Legi�o
Urbana prepara novo disco
Estado - 06/05/1996
Em est�dio desde janeiro, Renato Russo explica
como ser� o �lbum da banda
MARINA DELLA VALLE
Especial para o Estado
Em time que est� ganhando n�o se mexe. Essa m�xima
popular pode ser aplicada ao grupo Legi�o Urbana. Em
est�dio desde janeiro, o vocalista Renato Russo, o
guitarrista Dado Villa-Lobos e o baterista Marcelo Bonf�
trabalham em seu novo disco, que deve ser batizado de A
Tempestade. De acordo com Russo, o �lbum n�o apresenta
muitas inova��es em rela��o aos outros trabalhos da
banda. A gravadora EMI-Odeon ainda n�o tem data marcada
para o lan�amento, previsto para este ano. "� um
disco igualzinho aos outros, o mesmo Legi�o de
sempre", explica Russo. Ele define o novo trabalho
como uma mistura dos �lbuns Dois (1986) com As Quatro
Esta��es (1989) e partes do que ele classifica como
"discos s�rios", V (1991) e O Descobrimento do
Brasil (1994). Russo anuncia uma obra melanc�lica.
"Este foi um ano ruim", lamenta-se. "Perdi
meu namorado, tinha de ser assim." O grupo segue a
linha da cr�tica social e espiritualidade que vem
fazendo desde As Quatro Esta��es (1989), que alcan�ou
a marca de 870 mil c�pias vendidas. A Tempestade deve
trazer can��es sobre esperan�a. "A gente tenta
ser do bem e olhar para frente", diz Russo. A banda
n�o esquece a cr�tica social que deu o tom aos
primeiros �lbuns. "N�o posso dizer que todo mundo
est� feliz na praia, dan�ando a dan�a da garrafa,
quando est� tudo ruim."
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Legi�o
Urbana fala ao "Zap!" sobre sua volta
Estado - 25/09/96
Os integrantes da banda Legi�o Urbana, afastados dos
palcos e do p�blico nos �ltimos tr�s anos, est�o de
volta ao contato com seus f�s. Eles falam com
exclusividade ao caderno Zap! e acabam de lan�ar o CD A
Tempestade. Bras�lia, a cidade desse grupo jovem,
continua presente nas letras das m�sicas. "O novo
CD est� mais pop", explica Renato Russo, l�der da
banda, que tamb�m insiste em sua vis�o pessimista da
atualidade. Russo aponta v�rios dramas ocorridos este
ano, entre os quais o acidente que matou os Mamonas
Assassinas. Zap!
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Legi�o
Urbana faz can��es para jovens em crise
Estado - 24/09/96
Novo disco da banda, `A Tempestade', � manual de
educa��o sentimental repleto de clich�s
JOTAB� MEDEIROS
Convenhamos: os versos do Legi�o Urbana n�o s�o o que
costumamos chamar de "achados po�ticos".
Observem: N�o confunda �tica com �ter/N�o fa�amos do
amor algo desonesto/N�o se pode olhar pra tr�s sem
aprender alguma coisa pro futuro/Tem gente que n�o tem
nada e outros t�m mais do que precisam. Todos esses
MaCclich�s est�o em Tempestade (EMI), o novo disco do
Legi�o, que � uma esp�cie de manual de educa��o
sentimental para teenagers com crises existenciais e
mesadas espor�dicas. Renato Russo fala de como acha que
o teen deve proceder em assuntos de amor, trabalho,
amizade, lealdade, etc. Renato Russo, no entanto, n�o �
uma "m� influ�ncia", no sentido
kierkegaardiano do termo. Nem � burro: fez o disco com
uma inten��o clara e incluiu at� um manifesto dessa
disposi��o, a can��o Aloha, em que diz: A juventude
est� sozinha/N�o h� ningu�m para ajudar a
explicar/Por que o mundo/� esse desastre que a�
est�." Da�, Russo se disp�e a explicar o mundo.
Ele tinha abandonado essa inten��o desde que o acusaram
de messianismo, nos j� distantes anos 80. Sua
determina��o de dizer como o "�rf�o"
adolescente deveria se comportar tinha esmaecido quando
houve um quebra-costela monumental num show em Bras�lia,
os "�rf�os" se comendo de pau. Mas Russo
voltou � carga em A Tempestade. O problema � que ele �
um professor que subestima os alunos. Seu CD �, tamb�m
em sonoridade, um disco que remete � Legi�o dos anos
80, os "anos teen" do rock nacional. H�
equivalentes sonoros bastante evidentes, como a can��o
Dezesseis, que � um �bvio remake de Faroeste Caboclo,
desta vez tendo como personagem um James Dean tupiniquim.
O disco � muito ruim, para n�o ficarmos em eufemismos.
Os tecladinhos batidos de sempre conferem aquele som
pr�-Smiths a can��es-ladainhas (como o carro-chefe A
Via L�ctea), did�ticas ou catequizantes. Quando �
rock, � antediluviano, lembrando aquelas coisas a que
fomos submetidos nos anos dourados: Zero, Capital
Inicial, RPM. No mundo das hip�teses, sinceramente, �
at� prefer�vel que tenha sobrado Renato Russo ditando
regra do que o inferno que seria ag�entar Paulo Ricardo
ou Guilherme Isnard ou Dinho Ouro Preto, se esses
tivessem sobrevivido. Renato Russo � um dos mais
interessantes artistas do rock nacional e � tamb�m um
dos mais obstinados. Quando faz discos-solo, como o
excepcional Stonewall Celebration, se supera e mostra que
tem refer�ncias. Com o Legi�o, alterna bons e maus
momentos, como esse Tempestade, mas n�o se pode dizer
nunca que seja incoerente.
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Renato
Russo encara o desafio de cantar com sinceridade e muita
qualidade
Estado - 16/12/95
Tanto no trabalho com o Legi�o Urbana quanto nos
�lbuns solos, o m�sico, que gosta de cantar, procura
falar de relacionamentos, do universo humano, das
sensa��es e do que cada um tem dentro de si
GABRIEL BASTOS JUNIOR
Renato Russo tem fama de n�o gostar de dar
entrevista. � poss�vel, j� que ele sempre teve
problemas com a imprensa. Mas, quando come�a a falar,
n�o falta nada: carreira solo, Legi�o, depend�ncia
qu�mica, gera��o do rock de Bras�lia. S� n�o fala
do filho, Giuliano Manfredini, de 6 anos, autor dos
desenhos da capa de Equil�brio Distante.
Caderno 2 - Com Equil�brio Distante voc� est�
encarando definitivamente o desafio de ser int�rprete?
Renato Russo - O Legi�o tem uma concep��o
fechada de trabalho. As can��es e as letras t�m certas
caracter�sticas que est�o dentro desta concep��o do
que a gente representa dentro do universo do
rock-and-roll e da m�sica pop. E eu gosto muito de
cantar. V�rias vezes, pela pr�pria maneira que a gente
comp�e, a letra � mais importante do que o canto.
Caderno 2 - Isso come�ou com o The Stonewall
Celebration.
Russo - O Stonewall foi uma primeira tentativa de
fazer algumas coisas minhas j� que a Legi�o j� estava
sedimentada. Depois de 10 anos, sem desmerecer o trabalho
principal, os membros de um grupo v�o tendo outros
interesses e esse foi o meu. O Bonf� est� trabalhando
com computa��o gr�fica. O Dado tem o selo Rock It! O
que eu gosto mesmo � de m�sica. � de cantar. Eu tinha
algumas outras op��es, como escrever, trabalhar com
cinema, mas o que eu queria mesmo era continuar
trabalhando com m�sica.
Caderno 2 - O disco tinha 50% da renda revertida
para a campanha do Betinho.
Russo - Ele nasceu da id�ia de colaborar com a
campanha. E aproveitei para usar o disco como uma
esp�cie de exorcismo de um relacionamento que eu tinha
tido e n�o deu certo. E tamb�m para dar a minha marca
nos 25 anos da celebra��o de Stonewall, um marco na
quest�o dos direitos humanos em rela��o �
sexualidade.
Caderno 2 - Mas h� outros interesses al�m do
canto...
Russo - Para mim entra no aspecto da produ��o.
Nesse novo disco eu pude trabalhar com outros m�sicos,
com outras conven��es musicais. A grande brincadeira
dos discos solo � entrar mais pelo lado da m�dia para
ver como a coisa funciona. Quero fazer v�rias
entrevistas, fazer Xuxa Hits. Acho que o trabalho permite
isso porque � um outro conte�do. N�o � a minha vida
que est� ali na linha. Legi�o � uma coisa que o
p�blico percebe como sendo al�m de m�sica. Nos discos
solos estou fazendo s� m�sica.
Caderno 2 - E por que em italiano?
Russo - Gravar em outras l�nguas � simplesmente
para n�o confundir com o Legi�o Urbana. Eu at� poderia
ter gravado em portugu�s, mas as pessoas iam achar que
era o novo disco do Legi�o ou que a Legi�o acabou. Nos
dois discos fica bem claro que � um trabalho separado.
Mesmo se eu cantasse standards de MPB, as pessoas iam
confundir.
Caderno 2 - Seu disco solo acabou adiando o novo
da Legi�o...
Russo - A Legi�o est� lan�ando os seis
primeiros discos remasterizados em Londres, com uma
produ��o gr�fica atualizada. Consertamos tudo. � do
interesse da gravadora porque grande parte das nossas
vendas foi feita em vinil e essa � uma maneira de
relan�ar tudo em CD. Fizemos dez anos em 1994. A gente
n�o acha muito tempo, mas todo mundo ficou cobrando uma
comemora��o que resolvemos n�o fazer. Espero que isso
chame a aten��o das pessoas para o que foi feito nesse
per�odo.
Caderno 2 - A remasteriza��o n�o tira a
espontaneidade, principalmente do primeiro disco?
Russo - Voc� vai ouvir todos os erros. � a mesma
mixagem, os mesmos arranjos. Mas o som vem menos velado.
Embora a gente n�o tenha mexido na mixagem, os discos
v�m com essa sonoridade mais atual, mais dentro dos
padr�es da ind�stria nos anos 90.
Caderno 2 - Mas n�o significa deixar de lado o
novo disco.
Russo - A gente ainda n�o sabe qual vai ser o
perfil do disco. Mas j� tenho algumas letras escritas e
temos muito material.
Caderno 2 - Mas o formato do Legi�o ainda te
agrada?
Russo - Se me agradasse completamente eu n�o
estava fazendo disco solo. Mas acho que o desafio �
voc� fazer uma coisa sincera e de qualidade dentro do
formato. � um formato fechado, mas � muito profundo. Eu
n�o vou fazer uma m�sica como O Vira, dos Mamonas
Assassinas. Mas dentro da nossa concep��o existem n
possibilidades, porque a gente fala de relacionamento, do
universo humano, das sensa��es, do que cada um tem
dentro de si. Isso para mim � uma coisa quase infinita.
Tem coisas que s�o da mesma linha. Bader Meinhoff Blues
no primeiro; no segundo tem F�brica, ou mesmo �ndios;
no terceiro tem Que Pa�s � Este e Mais do Mesmo; no
quarto tem H� Tempos; no quinto tem Teatro dos Vampiros,
que � mais suavezinha, mas � a mesma coisa; e, agora,
em Decobrimento do Brasil, voc� tem Perfei��o. Eu
gostaria de acreditar que s�o m�sicas completmente
diferentes, mas se voc� parar para pensar, a gente est�
falando da mesma coisa.
Caderno 2 - Como mudou sua rela��o com as
drogas. Voc� continua dependente?
Russo - Tenho depend�ncia qu�mica, que � como
ser canhoto ou dalt�nico. Eu sou o que se chama
"dependente qu�mico em recupera��o". Eu
estou na programa��o desde 1992 e n�o uso mais nada
porque eu n�o posso. Comecei a beber com 17 anos. O
neg�cio s� ficou pesado mesmo aos 28.
Caderno 2 - Mas n�o era apenas �lcool...
Russo - Infelizmente a droga � um meio de
confraterniza��o social. No meio art�stico, quando
voc� faz sucesso, todo mundo oferece droga. E voc� vai
pegando porque o neg�cio � bom. De madrugada, no
est�dio, quando algu�m faz uma presen�a, voc� vai
ficar no cafezinho? E comigo ainda tinha essa hist�ria
de romantizar. E o pior � que a coisa chega a um ponto
que � vergonhoso. Eu vi que a situa��o estava feia
quando come�aram a dizer que eu armei cena em festa que
eu nem fui, s� porque j� era lugar-comum. �
completamente degradante e eu gosto de falar sobre isso
porque me d� for�a. Faz parte da programa��o lembrar
como era ruim. E o neg�cio � que n�o tem meio-termo.
Caderno 2 - O consumo ou n�o de drogas afeta a
criatividade?
Russo - Essa id�ia de voc� estar calibrado ou
usar subst�ncias qu�micas de qualquer tipo aumenta a
inspira��o n�o � verdade. Mas quando a pessoa bebe,
usa drogas e tudo o mais, ela naturalmente vai viver
certas experi�ncias que a pessoa careta n�o vai. Eu me
metia nuns buracos, conhecia umas pessoas estranhas. Se
eu fico na Galeria Alaska at� as 6 horas, vou ter uma
vis�o diferente de quem acorda cedo e pega sol. Algumas
pessoas acreditam que isso afete o trabalho, mas eu
acredito que n�o. A inspira��o � uma coisa que n�o
d� para voc� for�ar. Para mim geralmente vem quando eu
estou tentando dormir. Justo o contr�rio, quando eu
usava droga para tentar trabalhar, o resultado ficava
mais lento e disperso. J� teve vez que tomei �cido e
escrevi para caramba. Na hora voc� acha uma obra-prima,
mas no dia seguinte v� que n�o tem nada ali. Em geral
atrapalha tudo. Voc� usar alguma coisa durante a
mixagem, por exemplo, � um caos.
Caderno 2 - Mas voc� encaretou?
Russo - J� tenho uma boa bagagem de experi�ncia,
n�o preciso sair por a� para conhecer o mundo. J� fiz
muita loucura. E certas coisas que eu romantizava, hoje
n�o acho mais maravilhosas. Tenho alguns amigos que
ainda glamourizam essas coisas. Gente que adora os filmes
do Jim Jarmusch. At� acho alguns interessantes, mas eu
n�o queria conhecer aquelas pessoas.
Caderno 2 - Que pessoas voc� quer conhecer hoje?
Russo - Acho interessante conhecer pessoas de
verdade. Quando eu trabalhava no Minist�rio da
Agricultura, por volta de 1982, sempre fazia trabalho de
campo. Eu era da Coordenadoria de Orienta��o e Defesa
ao Consumidor, que foi um dos primeiros �rg�os do
g�nero. Eu sa�a por a� vendo se os supermercados
estavam ligando os freezers, se os produtos estavam na
validade. Eu tinha de fazer "povo fala" - parar
as pessoas na rua e conversar, por exemplo, sobre o
pre�o do feij�o. Era uma coisa fabulosa. Essas pessoas
me interessam. Agora, quem fica jogado na noite, drogado,
sem fazer nada de produtivo, n�o me interessa. O que eu
tinha em comum com essas pessoas era estar doid�o. Hoje
n�o tenho mais nada.
Caderno 2 - Quando foi esse emprego? Antes da
Legi�o?
Russo - Nessa �poca eu era o Trovador Solit�rio.
Tinha brigado com o pessoal do Aborto El�trico, porque
achava que eles n�o me davam valor. Ent�o ficava
tocando umas m�sicas s� com viol�o para abrir os shows
do pessoal. Foi nessa �poca que compus Eduardo e
M�nica, Faroeste Caboclo. A� eu cansei e resolvi fazer
a Legi�o com o Bonf�.
Caderno 2 - O Dinho Ouro Preto, do Capital, era do
Aborto?
Russo - N�o. Dinho era f� de Led Zeppelin. A
gente gostava de Siouxie and the Banshees, ent�o era
proibido gostar de Led Zeppelin e ter cabelo comprido.
At� que um dia ele virou punk. Mas todo mundo fazia tudo
junto e o primeiro disco do Capital tinha v�rias
m�sicas que eles pegaram do Aborto El�trico, porque o
Fl�vio (baixista) e o F� (baterista) eram do Aborto. Eu
peguei uma parte e eles pegaram as m�sicas que o Fl�vio
fez a melodia, como Veraneio Vasca�na.
Caderno 2 - E onde entrou a Legi�o nessa
hist�ria?
Russo - O Bonf� tocava em todas as bandas. Tocou
no XXX, no Dado e o Reino Animal, na Blitzz de Bras�lia,
nos Metralhas, no SLU. Eu fiquei s� no Aborto El�trico,
depois fui tocar viol�o e n�o sabia o que ia fazer. O
Dado na �poca estava tocando com o Dado e o Reino
Animal, mas ele n�o sabia tocar guitarra direito.
Caderno 2 - Como assim?
Russo - N�o sabia mesmo. Ele teve de aprender a
tocar guitarra para tocar com a Legi�o. Em duas semanas
ele aprendeu a tocar nove m�sicas. No primeiro show a
gente tocou Ainda � Cedo e ele praticamente nunca tinha
visto uma guitarra. A gente ficava: "Faz
barulhinho." Da� � que saiu o solo. At� se tornar
uma coisa completamente zen e espetacular como pode ser
ouvido em M�sica para Acampamentos. O solo dele naquela
grava��o ao vivo � fabuloso.
Caderno 2 - Mas a id�ia da Legi�o...
Russo - A id�ia, j� que tinha tanta gente
tocando, era fazer um n�cleo de baixo e bateria - eu e o
Bonf� - e chamar as pessoas para fazerem uma m�sica.
Por isso a gente era a Legi�o Urbana. S� que � claro
que isso n�o deu certo porque n�o dava para organizar.
Caderno 2 - Dado n�o foi o primeiro.
Russo - Chamamos um carinha chamado Eduardo
Paran�. Ele era meio jazz-fusion, mas era bonitinho.
Tinha umas hist�rias engra�adas, porque ele solava o
tempo todo e dizia: "Eu n�o vou fazer barulhinho
porque as pessoas v�o achar que eu n�o sei tocar."
E tinha um tecladista, o Paulo Paulista, que s� entrou
na banda porque tinha um tecladinho. A gente n�o
aproveitou nenhuma das m�sicas que fez nessa �poca. Era
muito pop. Eu escolhia todos os meninos bonitinhos e via
se tinham um m�nimo de talento musical. Tinha um menino
chamado Beto Pastel. Era um homem lindo, mas n�o sabia
tocar nada.
Caderno 2 - Voc�s chegaram a se apresentar com
essa forma��o?
Russo - Uma das primeiras apresenta��es da gente
foi em Patos de Minas. A gente sempre mimeografava as
letras e um general pegou a letra de M�sica Urbana, que
falava "os PMs armados e as tropas de choque vomitam
m�sica urbana". S� que a gente era supercomportado
no palco. Ent�o eles acharam que quem tinha feito o
panfleto havia sido a Plebe Rude.
Caderno 2 - Quando foi a entrada de Dado?
Russo - Um dia o Paran� cansou de brigar com o
Bonf� e decidiu estudar reg�ncia e "levar m�sica
a s�rio", como ele dizia. O Paulista tinha 16 anos,
mas parecia 30 e resolveu sair tamb�m. Nessa �poca
estava marcada a primeira grande apresenta��o das
bandas de Bras�lia, no audit�rio da Associa��o
Brasileira de Odontologia (ABO). Iam tocar as quatro
principais bandas combinadas em duplas: Plebe Rude,
Legi�o, XXX e Capital Inicial. Faltava um pouco mais de
um m�s e a gente completamente sem guitarrista. Chamamos
o Ico Ouro Preto, irm�o do Dinho, que tinha sido do
Aborto. No segundo ensaio ele desistiu. A� j� n�o
tinha ningu�m bonitinho e a gente chamou o Dado. Ele foi
aprendendo e acho que hoje � um dos grandes guitarristas
porque tem estilo pr�prio.
Caderno 2 - O contrato com a EMI veio do show na
ABO?
Russo - Os nossos padrinhos eram os Paralamas
porque o Bi era amigo de todo mundo. Eles gravaram
Qu�mica e sempre tocavam nos shows. Foram eles que
apresentaram uma fita ac�stica minha, que eu fiz para o
Ico levar para a Fran�a, para o George Davidson, da
Odeon, que quis saber quem eu era. S� que nessa �poca
eu j� estava com a Legi�o e eles n�o sabiam. Quando
nos viram, tomaram um susto porque era mais um trio de
Bras�lia com vocalista de �culos. Com o tempo acabou se
decidindo que era melhor eu s� cantar e o Bonf� chamou
o Renato Rocha. Na �poca, eu j� estava pensando no
disco. Ia se chamar Revolu��es por Minuto e ia ter
London London.
Caderno 2 - Voc�s foram a primeira banda a sair
direto em LP e fizeram sucesso de cara...
Russo - Na gravadora ningu�m dava nada. S� que o
disco vendeu, na �poca, 50 mil c�pias. Mas a grande
virada foi no Dois. Todo mundo esperava punk rock de
Bras�lia e a gente chega com uma balada de 5 minutos com
viol�o, voz e pandeiro, falando de um casal (Eduardo e
M�nica). Quiseram derrubar, mas como j� tinham errado
na primeira vez, a gente insistiu em fazer do nosso
jeito. E o disco vendeu quase 1 milh�o de c�pias. Nosso
primeiro contrato era para dois compactos. Depois que a
gente fez sucesso, passou a ser dois LPs. Contrato de
gravadora � que nem Fausto assinando com Mefist�feles:
uma v�rgula pode mudar tudo. Agora que o nosso contrato
est� acabando eles est�o tratando a gente a
p�o-de-l�. Este ano n�s vendemos 150 mil discos s�
com material de cat�logo.
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Rock �
uma atitude, n�o � moda
Estado - 15/12/1995
O m�sico escreveu texto em 1983 para panfleto de show
de bandas em Bras�lia Os componentes dos quatro
conjuntos fazem parte do que era conhecido como "a
turma da colina da UnB", isso por volta de 1977,
�poca da abertura e da redemocratiza��o (embora a UnB
ainda apresentasse alguns problemas). Um ma�o do
Hollywood estava por volta de Cr$ 15,00 e na cidade n�o
existia nada para se fazer. Mas aparece ent�o o que iria
acabar de vez com a pouca identidade que a capital tinha
com a m�sica discoteca. Bras�lia deixa de ser Bras�lia
e passa a ser Rio de Janeiro, como o Pa�s inteiro. Para
quem gostava de rock, essa foi o fim. Basta ser chamado
de colonizado o tempo todo; com a moda disco a situa��o
piora sensivelmente. Ainda mais porque na mesma �poca
aparece um movimento original e an�rquico que pretende
acabar com os falsos modismos. � a moda levada ao
extremo: anti-moda, anti-est�tica, anti- tudo. Mas aqui
� bem mais f�cil controlar a juventude oferecendo a
v�lvula de escape ideal e n�o uma m�sica que fa�a
todos pensarem e questionarem as hipocrisias construtivas
de uma sociedade falsa, � beira da autodestrui��o
at�mica. Ha-ha. M�sica discoteca n�o fala desse feito.
E a MPB parece estar mais preocupada com cama e mesa e a
sensa��o das cordilheiras. E o pessoal que faz letras
espertas n�o gosta de tocar rock no Brasil. O que fazer?
Ser� que est�o todos satisfeitos? Rock � uma atitude,
n�o � moda. � m�sica da �frica. N�o � m�sica
americana. Tem no mundo inteiro. Texto escrito por Renato
Russo em abril de 1983 para o primeiro grande show
reunindo as quatro principais bandas de Bras�lia:
Legi�o Urbana, Plebe Rude, Capital Inicial e XXX.
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Nos
shows, emo��o � o que importa
Estado - 15/12/1995
Renato Russo valoriza a mensagem, o que est� sendo
dito, mas tamb�m a maneira como tudo est� sendo dito, a
emo��o, que pode ser usada com intelig�ncia e
sensibilidade
GABRIEL BASTOS JUNIOR
Com o tempo, veio o sucesso retumbante. Faroeste
Caboclo ficou v�rios meses em primeiro lugar nas
principais FMs. O disco Quatro Esta��es foi demolidor e
o ao vivo, M�sica para Acampamentos, registrou a for�a
dos shows. A imagem estava constru�da. O cuidado agora
tinha de ser para mant�-la.
Desde um comentad�ssimo tumulto em um show da banda
em Bras�lia, em 1988, Renato Russo e a Legi�o Urbana
evitam ao m�ximo a superexposi��o e, sempre que podem,
ficam o maior tempo poss�vel sem trabalhar - nada de
shows, nada de entrevistas e alguma dor de cabe�a para o
empres�rio do grupo, Rafael Borges. "Ele � o
m�ximo porque administra o nosso n�o-trabalhar",
comenta Renato Russo.
Caderno 2 - Voc� hoje admite que n�o gosta de
fazer show.
Renato Russo - J� gostei muito. Agora tenho meu
p� atr�s porque sei quais s�o as dificuldades que eu
vou enfrentar e o que pode ocorrer. Acho que a marca foi
aquele show em Bras�lia. A gente come�ou a perceber que
existem muitas coisas envolvidas que podem n�o dar
certo. Ent�o a responsabilidade � muito maior e a
press�o tamb�m. Mesmo quando o show d� certo, tem
aquele engarrafamento monstro. Antigamente a gente n�o
pensava nisso.
Caderno 2 - O que mudou?
Russo - Comecei a pensar nisso quando tive filho.
A gente fica medroso quando tem filho. N�o � medo de
acontecer alguma coisa comigo, mas de acontecer alguma
coisa comigo que afete meu filho.
Caderno 2 - Mas quando come�a o show voc� se
transforma...
Russo - N�o tem uma transforma��o. Eu subo no
palco para cantar as m�sicas. Sei que � uma bobagem
dizer isso, mas para mim o palco � sagrado. O que
dificulta � a expectativa do p�blico e a nossa
responsabilidade. E ter de cantar as mesmas m�sicas
sempre. N�o tem um show em que a gente n�o cantou
Ser�. Voc� tem de passar por cima de um t�dio
existencial que tem com o material e cantar Ser� como se
fosse a primeira vez. Isso desgasta.
Caderno 2 - Voc� tamb�m n�o se sente desgastado
por se expor muito �s suas m�sicas? E tem tamb�m a
quest�o do canto, da voz mesmo...
Russo - S�o m�sicas dif�ceis de cantar para
passar a mensagem. H� Tempos come�a tranq�ila, no
final eu estou me esgoelando. Mas, quando voc� v�
aquele bando de gente cantando "h� tempos s�o os
jovens que adoecem", n�o tem como n�o se
emocionar.
Caderno 2 - E tem o som...
Russo - � muito desgastante se preparar para
fazer um show legal e na hora encontrar um som ruim. E o
som em todo lugar � ruim porque a gente n�o pode tocar
em lugar pequeno. A gente tenta equacionar essas coisas
para que tudo d� certo porque n�o h� nada melhor do
que um bom show. Lava a alma mesmo.
Caderno 2 - Essa impossibilidade de controlar tudo
� que afasta voc�s tamb�m dos festivais?
Russo - A gente � o tipo de banda que reclama se
tiver um outdoor da Coca-Cola no show. A turn� do As
Quatro Esta��es foi patrocinada pela Lacta porque a
gente achou que chocolate era tudo bem. Mas, mesmo assim,
tinha um monte de regrinhas. Isso dificulta as coisas
para a gente, mas se fosse de outra forma talvez
perd�ssemos essa coisa especial que a banda tem. Eu
estou l� falando de �tica, sofrendo, � o cantor
tr�gico-rom�ntico suicida e dependente qu�mico. O
p�blico n�o vai respeitar.
Caderno 2 - A rela��o da Legi�o com o p�blico
� maior que a m�sica...
Russo - Eles t�m um perfil que eu acho muito
bonito. S�o pessoas que n�o s�o racistas, n�o s�o
fascistas, que buscam uma determinada �tica frente ao
mundo complicado que t�m. Fico feliz de tentar trabalhar
com o que acredito e o que acredito passar na m�sica.
N�o existe confus�o.
Caderno 2 - A mensagem � o principal no trabalho
da Legi�o?
Russo - O importante para mim n�o � o que est�
sendo dito, mas como est� sendo dito. O importante �
que as pessoas conseguem se emocionar com a Legi�o. A
coisa que eu mais invejo � voc� fazer You Are Not
Alone, do Michael Jackson. � muito dif�cil. Voc� pegar
frases de cinco palavras, aquelas rimas pobres e
vocabul�rio batido e fazer algo que emocione as pessoas
� complicado. � muito f�cil ser Nick Cave. Se n�o
passar emo��o, n�o tem texto que segure. Eu vejo isso
pelo trabalho do Caetano. Voc� pega uma coisa como
L�ngua. Sinto muito, mas sou mais Le�ozinho. Existe uma
maneira de voc� usar a emo��o com intelig�ncia e
sensibilidade.
Caderno 2 - � nesse espa�o que voc� trabalha?
Russo - Eu gosto de brincar com o limite disso. �
o tal do brega, que eu falo. No Descobrimento do Brasil,
a gente brincou com muitas coisas, s� que ningu�m
percebeu. Tem m�sicas como S� por Hoje. Aquilo � show
da Xuxa com a diferen�a que eu falo de depend�ncia
qu�mica. Voc� se emocionar com Dumbo � diferente de
achar Mirnau ou Fassbinder o m�ximo.
Caderno 2 - Mas o p�blico de voc�s se aproxima
mais da MPB...
Russo - Sempre tive essa teoria - e � um crime eu
falar isso. O povo que conhece MPB, gosta de MPB e s�
ouve MPB, que tem uma rela��o religiosa com a MPB,
geralmente s�o pessoas chatinhas. Tem umas m�sicas
emblem�ticas de rodas de viol�o que eu acho muito
chatas.
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Frase
Estado - 16/12/1995
"Contrato de gravadora � que nem Fausto
assinando com Mefist�feles: uma v�rgula pode mudar
tudo."
(Renato Russo, cantor e compositor, em 16/12)
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O Anjo
Regenerado
Revista da Folha- Outubro de 1994
Rock star mais idolatrado do Brasil,
o cantor e compositor Renato Russo deixa o inferno,
atinge o purgat�rio e busca o para�so. Rompeu com o
v�cio e com as brigas de amor. De namorado novo e disco
solo, avisa a legi�o de f�s: "Chega de glorificar
a rela��o entre drogas e rock"
Hoje � noite, Renato Russo sobe ao palco do
Metropolitan, no Rio, para o �ltimo show da Legi�o
Urbana por um longo tempo. A partir de amanh�, ele troca
o furor do p�blico pela frieza do est�dio - onde se
entrega �s composi��es que os f�s do grupo s� v�o
conhecer em 95. Nesse meio tempo, ser� poss�vel ouvir
sua voz entre uma tram�ia e outra de Vera Fischer, a
malvada do folhetim de Gilberto Braga. Foi o pr�rio
Gilberto quem escolheu "Send In The Clows" - do
primeiro disco solo do vocalista, "The Stonewall
Celebration Concert"- para a trilha de"P�tria
Minha". Reconhecimento tardio (mas bem-vindo) de um
trabalho at� ent�o ignorado por r�dio e TV.
94 foi um grande ano para Renato Russo. Sentado
numa lanchonete a algumas quadras da sua casa, em
Ipanema, ele � todo sorrisos. Voz doce, revela detalhes
de sua carreira ou vida �ntima, lembra dos flertes com a
morte. O maior motivo da alegria: neste ano, o mais amado
rock star brasileiro emergiu de um inferno regado`a
�lcool e drogas.
"Eu era uma pessoa intrat�vel", diz,
com o resto de tristeza. "At� meses atr�s, n�o
era poss�vel falar comigo." Agora �: durante tr�s
horas, ele discorre animadamente sobre o disco solo, o
filho, paix�o, homossexualismo, Aids, messianismo,
drogas e rock'n'roll.
D� para dividir a hist�ria de Renato entre
antes e depois do disco solo (lan�ado em junho). Foi um
marco. Sinalizou o fim da paix�o pelo americano Scott,
com quem viveu entre 89 e 90. Escancarou sua
homessexualidade ( assumida em p�blico em 88), com
can��es de amor endere�adas a homens. E abriu outra
perspectiva em sua carreira - a de Renato Russo
"crooner".
"Escolhi can��es que falassem da minha
experi�ncia pessoal", conta Renato. Ele n�o teve
escr�pulos em reunir no mesmo disco cl�ssicos da
can��o norte-americana (de Leonard Bernstein &
Stephen Sondhein, Hoagy Carmichael e Irving Berlin, entre
outros) e hits de compositores brega-pop, como Billy Joel
e Don Henley. Os detratores de plant�o se surpreenderam:
em lugar da esperada caricatura, encontraram um trabalho
despretencioso e delicado - que alterna momentos de dor
(como "The Heart Of Matter") com tiradas
alegres ("Cherish", antigo hit de Madonna).
At� agora, o disco vendeu 40 mil c�pias, com um
detalhe: 50% dos direitos s�o doados � campanha do
soci�logo Betinho.
Para Renato, por�m, esse disco tem um
significado bem particular. � o seu manifesto de
sobreviv�ncia, o passo final num processo de
recupera��o iniciado um ano antes. "No come�o de
93, eu tinha chegado ao fundo do po�o. "Eu estava
igualzinho ao Kurt Cobain", diz, referindo-se ao
vocalista do Nirvana, dependente de hero�na, que se
matou com um tiro na cabe�a em abril.
"Dizem que ele foi covarde. As pessoas
n�o t�m id�ia do que � o sofrimento de um dependente
qu�mico. � um vazio espiritual! Eu sei o que � acordar
e ver tudo cinza, n�o ver alegria nas pessoas que te
amam, tamanha � sua solid�o."
Renato estava nessa desde os 17. "A coisa
vai num crescendo. Depois que voc� faz sucesso, todos te
oferecem, aparecem os traficantes de plant�o.
Experimentei tudo, mas sempre terminava em �lcool e
tranquilizantes. No bar e na farm�cia."
Em 90, no auge da popularidade da Legi�o (870
mil c�pias vendidas de "Quatro Esta��es",
shows com 50 mil pessoas), Renato foi ao inferno pela
primeira vez. "Na �poca de "Quatro
Esta��es", eu ia para os shows com um m�dico ao
lado. Peguei pesado com o Scott, porque ele era viciado
em anfetaminas. Depois, ca� na hero�na. Usei durante um
m�s e meio. No final de 90, estava um baga�o,
mag�rrimo, cadav�rico. Tive uma hepatite s�ria e quase
morri."
A doen�a e a briga com o namorado -
traum�tica - o levaram a procurar uma terapia de apoio.
Ficou bem o suficiente para escrever as letras do disco
"V" (v�rias delas sobre drogas). Na turn�
seguinte, em 91, outra reca�da. "Cancelamos os
shows no Nordeste porque eu estava bebendo de cair, com
tend�ncias suicidas. "No come�o de 93, suas
bebedeiras foram parar nos jornais. "No meu
anivers�rio, 23 de mar�o, pensando no meu filho, em
mim, vi que n�o podia continuar assim."
Em abril daquele ano, Renato ingressou em um
grupo de auto-ajuda e passou a seguir a
"programa��o dos 12 passos", esp�cie de
manual do viciado. Reza que a pessoa deve reconhecer a
impot�ncia diante da depend�ncia qu�mica e se
comprometer a lutar dia-a dia. "Hoje, essa � a
minha filosofia de vida".
Ficar careta tem suas vantagens. O rapaz est�
de amor novo. "Eu nunca conseguia namorado. Agora,
est� chovendo na minha horta", diz. Empolgado, d�
um sorriso maroto e imita uma velhinha: "Sabia que
ele � viado? Mas � bonzinho! � inteligente at�,
limpinho...".
Renato solta uma gargalhada. Esse tipo de coisa
n�o incomoda mais. "Resolvi minhas �ltimas
d�vidas quando fui aos EUA em 89. No Brasil, ou voc� �
enrustido e pega mich� ou travesti, ou �
bicha-discoteca. N�o sou nada disso". Em Nova York,
descobriu que n�o precisava "desmunhecar".
"Gay l� pode ser macho. Eles s�o setorizados:
musculosos, sadomasoquistas, loucos...".
No Brasil, a revela��o de que ele era gay,
ainda em 88, n�o arranhou sua popularidade.
Fidel�ssimo, o p�blico da Legi�o cantou sem titubear o
refr�o "eu gosto de meninos e meninas".
Era, na verdade, o ingrediente
que faltava para completar a improv�vel receita do grupo
de Bras�lia - o mais bem - sucedido no
"boom"do rock nacional. Em retrospecto, �
dif�cil entender como aquela banda de letras
quilom�tricas e desprovida de um s�mbolo sexual como
Paulo Ricardo chegou ao topo. Ou como manteve-se no alto:
o disco mais recente, "Descobrimento do Brasil"
est� na marca de 250 mil c�pias vendidas.
Pais e filhos
Nome: Renato Manfredini Junior
Apelido: Junior
Data e local do nascimento: 23/03/60, Rio
de Janeiro
M�e e Pai: Maria do Carmo e Renato
Irm�os: uma, Carmem Teresa Manfredini
Filho: Giuliano Manfredini, 5 anos
Signo: �ries
Forma��o: Jornalismo, em DF
Altura e Peso: 1,74m, 65 Kg
Perfei��o
Algo no corpo o incomoda? "Minha
sa�de. Foram 15 anos de droga- adic��o".
Parte do corpo de que mais gosta:
"C�rebro. E tamb�m adoro as minhas m�os".
Cuidados com o corpo: "No momento,
manter-me longe do alcoolismo j� � um milagre".
A que horas dorme e acorda: "Vou
dormir �s sete da manh� e acordo meio-dia. De dia, n�o
fa�o nada, porque o mundo est� acontecendo".
Propriedades: "S� o meu
apartamento".
Meninos e Meninas
S�mbolo sexual: "O Leonardo, da
sele��o. Eu acho ele um gatinho".
Primeiro beijo: "Aos 9 anos, com a
minha namorada nos EUA. Achei a coisa mais nojenta".
Primeira transa: "Foi num carro, aos
17"
Lugar mais esquesito onde fez amor: "Embaixo
do telhado, no v�o da caixa d'�gua"
Melhor lugar para fazer amor: "Um
lugar onde a gente se sinta mais seguro".
Fantasia n�o- realizada: "Ganhar o
Oscar".
Homens s�o: "Bobos, que nem
cachorro".
Mulheres s�o: "Misteriosas que nem
gato".
O que te seduz?: "Esp�rito, bondade,
desejo".
O que te broxa?: "Estupidez,
pretens�o".
Melhor cantada: "Do Scott, em Nova
York, num bar gay. Vi aquele menino loirinho, cara de
estivador, vindo na minha dire��o! Pedi um cigarro, ele
disse: N�o!. Saiu. Voltou com um ma�o novinho pra mim.
Ficamos juntos dois anos".
Pior cantada: "Gosta de mulher mas
tamb�m gosto de viado! V� a merda!".
�ltima pessoa que levaria para cama:
"Paulo Francis"
Quase sem querer
Maior maldade que j� fez: "N�o
admitir que as pessoas se preocupavam comigo".
Maior mentira que j� contou: "S�
mentiras bobas. Aqui, eu n�o falei toda a verdade".
Arrependimento: "N�o conhecer a
programa��o dos doze passos na �poca do Scott".
Todas as can��es
Palavra preferida: "Ess�ncia".
Palavra que mais usa: "Eu".
Can��o: "I Get Along Without You
Very Well"
Compositor preferido: "Bob
Dylan".
Livro: "Sonetos, Shakespeare".
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