Legi�o Urbana Uma Outra Esta��o
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1988 - O SHOW DE BRAS�LIA

Correio Braziliense (14/06/1997)

NOITE DE SOM E F�RIA

A Volta da Legi�o Urbana � Bras�lia para o lan�amento do disco Que Pa�s � Este: 1978/1987 foi planejada meticulosamente durante cinco meses. Mas falhas no esquema de seguran�a contribu�ram para o surgimento de tumultos antes, durante e depois da apresenta��o da banda.

A id�ia surgiu durante uma festa estranha, " um reveillon meio maluco", segundo o anfitri�o, o empres�rio e produtor de shows Fernando Artigas. Em um apartamento na 312 sul , no primeiro dia de 1988, Artigas e Renato Russo decidiram repetir a parceria que tinha possibilitado a realiza��o do, at� ent�o, maior show da Legi�o Urbana em sua cidade, no gin�sio de esportes, em dezembro de 1996.

" Eu quero fazer muito, mas no gin�sio n�o d�, � pequeno", disse Artigas, ciente da popularidade vertiginosa que a banda brasiliense experimentava depois do lan�amento do terceiro disco: Que Pa�s � Este: 1978/1987. "Ent�o vamos para o est�dio (Man� Garrincha), definiu Renato que fez uma exig�ncia: Esse vai ser o show da minha vida, por isso quero que embrulhe pra presente, que nem Bon Jovi", comparou o vocalista, referindo-se � mega estrutura das apresenta��es da banda americana.

N�o era uma empreitada f�cil. O �ltimo show da Legi�o na capital, para lan�ar o segundo disco (Dois), foi atribulado. Houve superlota��o no gin�sio Nilson Nelson e muitas pessoas se machucaram ao pular da arquibancada para a pista. Al�m disso a excurs�o de lan�amento do Que Pa�s � Este estava lotando gin�sios pelo Brasil, mas ainda n�o havia sido levada a um est�dio de futebol. "Era uma empreitada dif�cil. Eu temia um show no est�dio " , reconhece Rafael Borges, empres�rio da banda desde setembro de 1987.

Por causa dos la�os afetivos e profissionais anteriores, a produ��o do show foi entregue � empresa brasiliense Agora Eles, de Fernando Artigas e dos irm�os Rodrigo e Marcelo Amaral. Mesmo com a resist�ncia de Rafael. "Eu teria optado em fazer com produtores mais experientes, como a WTR, com quem t�nhamos trabalhado antes. Mas os pr�prios legion�rios pediram para eu dar aten��o especial � proposta do pessoal de Bras�lia, que estava muito entusiasmado", lembra o empres�rio.

O "pessoal de Bras�lia" estava t�o entusiasmado que contratou 500 seguran�as particulares - o maior contingente j� contratado para um �nico evento realizado na cidade. Tamb�m fez quest�o de fazer seguidas reuni�es com representantes do poder p�blico e outras entidades - Secretaria de Seguran�a P�blica, Defer (administrador do est�dio), Defesa Civil, Cruz Vermelha e etc. Tudo para garantir a seguran�a do p�blico. Tanta prepara��o n�o evitou que fossem cometidos erros prim�rios. Como a altura do palco, por exemplo, apenas 2m10 separavam o tablado de madeira do gramado do est�dio." Foi um pedido do Renato, que n�o queria ficar distante do p�blico", argumenta Artigas. " Se foi pedido n�o passou pelo escrit�rio, n�o era pra ficar 30 metros acima, mas tinha que ser proporcional ao est�dio e n�o podia interferir na comunica��o do artista com o p�blico", rebate Rafael que fez inspe��o r�pida no palco e o achou um pouco vulner�vel".

Na passagem de som o clima n�o era muito tranq�ilo. Renato Russo reencontrou Artigas e comentou: "Realmente o est�dio est� embrulhado para presente, mas tenho medo que possa virar Gimme Shelter", numa refer�ncia � m�sica dos Stones que diz: "(...) uma tempestade amea�a minha vida". O clima ruim se dissipou quando os amigos sa�ram do est�dio. Os dois , mais a irm� de Renato (Carmem Tereza) e uma amiga em comum jantaram no Piantella em clima de comemora��o antecipada do que o vocalista chamava de "o show dos meus sonhos". "Ele estava super feliz", garante Artigas.

No S�bado, dia 18 de junho, a banda passou quase o dia inteiro no hotel Saint Paul. Enquanto isso o clima come�ava a pesar, �nibus chegavam com os vidros quebrados. Longas e desorganizadas filas formavam-se em frente ao est�dio. Na tentativa atrabalhoada de organizar a confus�o, a pol�cia agiu com energia dentro e fora do est�dio. C�es e cavalos foram usados para intimidar o p�blico, estimado em 50 mil pessoas.

O tumulto na entrada obrigou os produtores a pedirem que a Legi�o atrasasse o in�cio de sua apresenta��o, marcada para �s 21:30 - n�o havia banda de abertura. "Em dezembro de 86, o show come�ou impreterivelmente na hora e o pessoal estourou as catracas do gin�sio. Foi por uma quest�o de seguran�a que atrasamos", justifica o empres�rio. O atraso de quase uma hora irritou a banda e o p�blico , j� incomodado com a a��o en�rgica da pol�cia e dos seguran�as. Mesmo que Renato tenha come�ado o show Perguntando se todos estavam ali para se divertir, j� estava aceso o estopim para os tumultos ocorridos durante os inesquec�veis 58 minutos de som e f�ria.

 


POR QUE A LEGI�O PAROU

 

Dado Villa-Lobos sentiu um n� na garganta ao passar pelo est�dio Man� Garrincha, em Setembro de 1997. Convidado pelos Paralamas do Sucesso para um show no gin�sio Nilson Nelson, nove anos depois da �ltima apresenta��o da Legi�o Urbana em Bras�lia, o guitarrista voltou � cidade apreensivo, sem saber o que poderia acontecer.

� tarde ele ficou andando perto do est�dio, relembrando o tumultuado show de junho de 1988. � noite, no palco, foi recebido pela plat�ia como nos bons tempos, com gritos de " � Legi�o! � Legi�o!". Saiu emocionado, com a alma lavada." - Foi a reden��o.

Marcelo Bonf� sentiu o mesmo no Tributo a Renato Russo, realizado no dia 2 de Dezembro do ano passado. "Foi muito legal, muito positivo", diz o baterista. "Mas nunca tive problema nenhum com a cidade. Foi em Bras�lia que tudo aconteceu. Foi uma fase �tima, m�gica, que n�o volta mais. A gente s� n�o tocou mais em Bras�lia porque n�o tocava em lugar nenhum", garante.

Meio desligado, Bonf� lembra pouco do show do Man� Garrincha. Lembra do rapaz que grudou no pesco�o do Renato, dos gritos antes do show (� Legi�o! � Legi�o!), do clima de festa, de euforia. " Quer�amos fazer uma festa, est�vamos muito empolgados, mas a coisa se desvirtuou".

"Era um show intenso e quando � assim anda mais r�pido", comenta o baterista. Com uma m�sica atr�s da outra, sem respirar, voc� pode tocar mais de uma hora que as pessoas acham que foi 15 minutos. Ali quatro horas n�o seriam suficientes".

O baterista ficou mais chateado porque as pessoas n�o entenderam o que havia acontecido. "At� meus pais falaram: 'P� voc�s n�o podiam Ter feito isso!'. Ningu�m entendeu. A gente n�o quis voltar porque disseram que estavam quebrando tudo."

"As coisas estavam fora de controle", afirma Dado Villa-Lobos. "O palco era daqueles de encaixe seria mais f�cil passar por baixo do que pular. E essa grade estava passando de m�o em m�o... os �nibus j� chegaram depredados, as pessoas chegaram com esse est�mulo, com essa energia. Ficou insustent�vel. Faltou estrutura dos organizadores. O palco era baixo e a seguran�a falha, n�o esperavam tanta gente".
Segundo Renato Russo em entrevista ao Correio Dois em junho de 1996, "era tanta gente que parecia que estava vazio ". Para Marcelo Bonf�, era tanta gente que a vontade de tocar j� n�o era a mesma. "Sabe quando passa a hora do almo�o e voc� n�o tem vontade de comer?", diz o baterista. "Foi assim, tinha gente demais".

E foi nesse show que Dado Villa-Lobos se viu numa "grande banda de rock". "Foi nesse dia que materializei, pela primeira vez, que as coisas tinham mudado", diz o guitarrista. "No come�o a Legi�o Urbana era s� uma forma de express�o art�stica, musical, e a partir desse dia virou 'carreira'. Descobri que, finalmente �ramos uma grande banda de rock, que supostamente se presta a isso tamb�m".

 


TRISTEZA NO DIA SEGUINTE

 

Mutismo absoluto. Foi essa a atitude tomada por Renato Russo desde o momento em que deixou o est�dio Man� Garrincha at� a hora em que deixou o apartamento da fam�lia, na SQS 303, no final da tarde de Domingo, seguindo para o Aeroporto Internacional, onde embarcou para o Rio.

Com a irm� Carmem Tereza Manfredini s� conversou o necess�rio, assim como com as amigas Ana Paula Camarinha e C�ntia Paix�o. Abriu exce��o apenas para Celso Ara�jo, � �poca rep�rter do Correio Braziliense, para quem deu entrevista.

"Sa�mos juntos do est�dio e o J�nior manteve-se calado, mas era vis�vel sua tristeza. Ao chegar tomou banho, relaxou e foi dormir na cama dos nossos pais que estavam passando uma temporada no Rio". Contou Carmem.

A irm� lembra que Renato n�o fez qualquer coment�rio, mesmo depois de tomar conhecimento das picha��es feitas em paredes de pr�dios da quadra. "Ele ficou arrasado, mas n�o se manifestou e n�s preferimos respeitar o sil�ncio dele".

"Isso (as picha��es) marcou demais, tocou muito o Renato, principalmente porque ele gostava muito de Bras�lia, nunca deixava passar em branco um ataque � cidade", confirma o empres�rio da banda, Rafael Borges.

Carmem revela que al�m das picha��es, aconteceram v�rios telefonemas, "de pessoas que faziam amea�as". Certamente foi por isso que Fernando Artigas, um dos produtores do show, convocou o judoca Muril�o Azevedo, amigo de Renato desde a �poca do movimento punk, ao apartamento.

Muril�o afirmou que chegou � 303 sul Domingo pela manh�, acompanhando o vocalista ao aeroporto. "na garagem descobrimos uma garota debaixo do carro que levaria Renato ao aeroporto. A menina queria um aut�grafo. Ao chegar ao aeroporto fomos direto para a sala Vip, onde Renato evitou contato com qualquer pessoa."

Quando se encontrou com a m�e Maria do Carmo, no rio, Renato falou de sua decep��o e tristeza por n�o ter conseguido fazer o "show dos seus sonhos". Ela acredita que se o vocalista n�o tivesse morrido, a legi�o voltaria a fazer show em Bras�lia. "Para todo mundo, o J�nior dizia que a Legi�o n�o tocaria mais na cidade. Tempos depois, por�m, conversando comigo, o pai, e a Carmem deixava em aberto essa possibilidade". � o que acha tamb�m Rafael Borges: "muito tempo depois, ele me olhou com um ar meio maroto e perguntou: "e se a gente voltasse a Bras�lia?".

Texto enviado por: Fabiano Moraes - Legi�o Urbana Web F� Clube

 

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