Legi�o Urbana Uma Outra Esta��o
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As regras e os limites de Renato Russo
Entrevista para a Show Bizz em 95

Renato Russo � um �dolo. Os f�s reconhecem nele a sinceridade e a sensibilidade que o sucesso n�o conseguiu transformar. E que sucesso: os setes discos da Legi�o Urbana venderam cerca de 3,5 milh�es de c�pias, sendo que Dois, o recordista de 86, vendeu 800 mil c�pias. Na vota��o do Pr�mio BIZZ 94 os leitores elegeram a Legi�o na categoria melhor show nacional. Renato, l�der da banda, ganhou dois pr�mios: melhor letrista e melhor vocalista.

Dono de uma personalidade que alterna estados de depress�o e alegria, Renato est� curtindo, segundo ele mesmo, "uma fase boa". Mergulhado na carreira solo, gravou The Stonewall Celebration Concert. E agora, prepara uma colet�nea de m�sica pop italiana.

Renato Russo recebeu a equipe da BIZZ em sua casa, no Rio de Janeiro, para uma conversa sobre as regras e os limites que ordenam a criatividade e a loucura de um dos g�nios da m�sica brasileira.

por Felipe Zobaran e H�lio Gomes


Era uma daquelas tardes cariocas em que as folhas das �rvores n�o se movem. Nenhuma brisa para refrescar o ar canicular de janeiro. Na rua Nascimento Silva, onde mora Renato Russo, o calor � ainda mais desconfort�vel porque vem carregado da umidade que emana da lagoa Rodrigo de Freitas e do mar de Ipanema.

O pr�dio que abriga Renato parece um pequeno castelo, uma miniatura. Tr�s andares, sem porteiro e elevador. � o tipo de moradia mais cobi�ada pelos artistas cariocas: simples, charmosa e low profile.

Tocamos a campainha. Quem atende � uma voz de mulher. Estranho, ach�vamos que estar�amos sozinhos com o cara. Duas portas s�o abertas eletronicamente. Subimos escadas, dois lances. O calor sufoca. A porta do apartamento j� est� aberta. De l� sopra um delicioso vento polar. Entramos afobadamente, quase esbarrando nas pernas esticadas de Russo, que fuma no sof� ao lado da porta.

"Nossa, que calor! E que ar condicionado delicioso". Primeiras palavras. Primeiros olhares. A voz de mulher se chama Tereza Durante, trabalha com Rafael Borges, empres�rio da Legi�o Urbana, e veio acompanhar a entrevista. Depois das amabilidades iniciais, ela sente e apenas observa a conversa das duas pr�ximas horas.

Renato assume um ar pr�tico e organiza a entrevista. Uma garrafa de �gua Minalba e quatro copos, um cinzeiro, um isqueiro e dois ma�os de cigarro, um Benson & Hedges mentolado e um Marlboro de caixinha sobre a mesa com tampo de m�rmore na sala de jantar. Durante a conversa fuma apenas os mentolados, ignorando o Marlboro.

As paredes do apartamento misturam tons leves e papel de parede cl�ssico, estilo ingl�s. Os m�veis s�o antigos, trabalhados em madeira. Esculturas e bibel�s enfeitam os cantos. Sobre o ch�o, sofisticados tapetes kilim. Quadros grandes de inspira��o primitivista dominam a sala. Ao lado da porta h� tr�s espingardas Winchester antigas penduradas, como se o dono da casa esperasse uma invas�o de jagun�os a qualquer momento.

"As espingardas s�o pra dar um ar macho no apartamento", explica Renato em tom de deboche. Ele veste uma camisa listrada e shorts. No pulso, um rel�gio Nossa Senhora no mostrador. No dedo anular esquerdo, um anel de pedra azul. No rosto, barba cheia e �culos estreitos. Muita voz, muita energia e movimento, muita fragilidade.

Renato Russo est� bem, segundo ele mesmo. � o que dizem tamb�m os amigos. E dizem com voz de al�vio. Eles sabem o que acontece quando Renato est� mal. Provavelmente n�o gostam nem de lembrar. O buraco, a descida, a queda. As drogas, o �lcool, a pervers�o e o perigo. Quando Renato est� mal, nenhum po�o � fundo o suficiente.

O comportamento ciclot�mico � parte da vida de Renato. Talvez seja o pre�o do seu g�nio de poeta. Uma instabilidade interior, uma turbul�ncia incessante. Este estado de esp�rito controla o filho de Bras�lia. Quando est� mal, Renato implode. Quando est� bem, pode canalizar a energia da loucura para seus projetos. Fala muito e gesticula sem parar, jogando na nossa cara sua formid�vel capacidade de comunica��o. Parece coisa de mulher, esse jeito de agarrar a aten��o do interlocutor com uma combina��o de express�o verbal e corporal.

Renato n�o se preocupa em disfar�ar a homossexualidade, pelo contr�rio, � uma das for�as que o conduzem. Ele tem viajado bastante ultimamente, com a cabe�a aberta para a pluralidade do mundo, deixando pra tr�s as amarras culturais e agitando a peneira e valores que seleciona uma nova vis�o da vida e do trabalho de artista. � como se tudo fosse permitido, mas nem tudo aconselh�vel. "Sei que sou cheio de regras e limites", diz ele.

Numa entrevista recente, Renato soltou a seguinte frase: "Voc� pega a BIZZ e v� que aquilo est� tudo velho". Para quebrar o gelo, decidimos come�ar olhando para o nosso pr�prio umbigo.

Qual � o problema da BIZZ?

Pra mim, o �nico problema da BIZZ � n�o informar o leitor que a revista fecha �s vezes com at� tr�s meses e anteced�ncia. Ent�o, dada a cobertura que existe hoje nos grandes jornais, algumas informa��es da BIZZ e a sua pr�pria linha editorial sofrem um pouco. Todas as entrevistas que eu dei at� hoje, que a Legi�o deu, eram muito imediatas e quando sa�am na revista estavam completamente defasadas - e n�o existe um conhecimento por parte dos leitores da BIZZ que as coisas s�o fechadas com muita anteced�ncia. Essa � a minha �nica cr�tica. Mas isso � bobagem, eu acho a BIZZ muito legal, a gente j� tocou em anivers�rio da BIZZ.

Como o f� de rock Renato Russo lida com o f� do Renato?

Ah, isso d� pra escrever um livro, n�? Eu tenho ficado um pouco surpreso com uma certa intensidade dos f�s de uns dois anos pra c�. Eu realmente fiquei surpreso que o som no Ibirapuera (em 16 de junho no ano passado - confira o Ao Viva da BIZZ 109) estivesse ruim e nenhuma pessoa falou alguma coisa, at� mesmo pra ajudar a pr�pria banda. N�s n�o est�vamos esperando... de uma certa maneira foi at� pela rea��o do p�blico que o show tava ruim. N�s somos um pouco inseguros, j� levamos tanto na cabe�a, a gente sempre acha assim: "ser� que eles ainda gostam da gente?" A gente n�o tem muita paci�ncia para fazer um esquema gigantesco, a gente come�ou com os punks e isso � uma coisa muito forte. Agora a gente virou dinossauro.

Voc� � um agressivo tiranossauro ou um pacato brontossauro?

Ai... Isso eu j� n�o sei, n�o sei que bicho eu seria. Acho que eu sou um ancestral do cavalo, um unic�rnio talvez, mais pra essa praia (risos). Na quest�o dos f�s, existe um comportamento passivo/agressivo por parte dos mais queridos que � uma coisa que �s vezes incomoda, porque eles te d�o muito mas tamb�m querem muito em troca. Eu recebo muitas cartas, muito anjinho, presentinho e tudo mais. Mas ai de mim se n�o der a aten��o que eles merecem.

O Raul Seixas costumava dizer que ficava frustrado depois de tocar para dez mil pessoas e achar que s� duas ou tr�s entendiam o que ele estava falando. Isso acontece com voc�?

N�o. A quest�o da compreens�o � muito complicada. Eu por exemplo, n�o entendo nada de absolutamente nada. Eu vou levando a minha via. Com a minha experi�ncia de vida, interpreto as coisas de uma determinada maneira, mas eu posso estar errado. N�o � uma quest�o de entender ou n�o, � uma quest�o de se identificar, e eu acho que todo f� da Legi�o se identifica. Porque sen�o eles n�o cantariam as nossas m�sicas, n�o teriam o carinho que t�m pela gente. Mas tem o seguinte, o que a gente sempre falou foi: "Seja sua pr�pria pessoa", e o que vejo em alguns f�s � a anula��o da pr�pria pessoa por causa da Legi�o Urbana, e eu acho isso p�ssimo.

Isso te assusta?

N�o assusta. O lance � o seguinte, seja voc� mesmo. Tudo bem gostar de uma banda, n�o � s� a Legi�o Urbana mas vira uma coisa muito Menudo, sabe? Teve uma �poca que eu me interessei pelo Menudo e tudo, sabe... (risos) Quem s�o esses meninos de Porto Rico?! E que concep��o interessante para uma banda! John e Paul ficaram velhos, ent�o vamos arrumar outros John e Paul. Eu achava o trabalho deles bem interessante. Consegui at� conhecer os caras do Menudo, t�te-�-t�te. Aqueles caras eram garotinhos de 17 anos? Que nada, eram todos uns talalaus de 20 e tantos anos, uns bof�o lindos, maravilhosos...

E como ser� que eles est�o agora?

Ah, sei l�, teve aqueles esc�ndalos. Eu sei que eles eram galinhas pra caralho. Tinha um, aquele Robby, Bobby, sei l�, acho que era o Roy... S� dava buxixo, porque ele gostava de mulher mais velha. � como os Beatles falavam, � Satyricom na estrada. A n�o ser que voc� tome uma outra postura. Por exemplo, agora o Dado (Villa-Lobos) e o (Marcelo) Bonf� viajam com as meninas e as crian�as. Mas a vida na estrada � uma coisa muito louca.

Voc� n�o sente falta da estrada?

N�o, eu odeio a vida na estrada. O que dificulta pra mim � a rela��o com os f�s, eu sinto uma responsabilidade muito grande. Hoje em dia, a Legi�o Urbana existe por causa do p�blico. Sinceramente, eu t� com uma outra idade, uma outra vis�o da vida. Eu vou escrever uma m�sica sobre o que, reclamando do meu cart�o American Express? N�o tenho problemas de espinhas, n�o tenho problemas com meus pais, n�o quero ficar catando drogas, n�o tenho problemas de namorar uma menina ou namorar um garot�o. Minha problem�tica � outra, saiu da coisa do rock'n'roll. A minha coisa agora � manter a sanidade, tentar manter as coisas no lugar e n�o deixar o mundo interferir na minha vida. Mas essa coisa dos f�s, � sempre necess�rio ter um certo discernimento. Quando eu vejo f� de uniforme, todos eles com bandanas e camisetas da Legi�o, jogando coisas no palco... Eu vou at� fazer uma reclama��o: n�o joguem coisas no palco, pode ser o que for, mas n�o joguem! Tirando isso, essa coisa dos f�s � maravilhosa. Tem essa coisa curiosa, �s vezes pinta cada garot�o bonito nos shows. Eu fico dando em cima deles, mas n�o pode, n�? O que eu sou pra eles � uma coisa que eles constru�ram no imagin�rio deles.

O que voc� achou do suic�dio do Kurt Cobain, no ano passado?

Tadinho, eu acho que era uma onda muito pesada para ele segurar. Brasil � Brasil, n�? N�s somos maravilhosos, agora vai viver l� nos Estados Unidos. � muito complicado. Pra ele foi uma viagem muito complicada, foi muito, muito grande. O problema dele foi a droga, n�? Sabe, voc� n�o consegue sair. N�o vou me comparar ao Kurt Cobain, mas voc� turva tudo, n�o sabe o que est� acontecendo. � um baixo astral terr�vel. Eu tive essa postura do Kurt. Eu entrava no palco pra, sabe... Mas agora n�o! Quero continuar a fazer shows este ano, depois a gente vai gravar um disco novo, a Legi�o - o Dado e o Bonf� j� est�o trabalhando em algumas coisas. Vai ter o ILTA (conven��o da Associa��o Internacional de L�sbicas e Gays), que eles v�o fazer aqui no Rio de Janeiro e eu t� a fim de participar de alguma forma, talvez fazendo o show do Stonewall, mas eu n�o posso falar nada ainda.

O que se diz � que o Cobain era uma pessoa contestadora e que de repente se viu completamente usado e n�o segurou...

Eu acho que ele era um artista extremamente talentoso, extremamente sens�vel e supergente fin�ssima. Chegou um ponto em que ele passou a depender da droga para se relacionar consigo mesmo e com o mundo, sem perceber que isso � que quebra a sua espiritualidade. Eu acho muito bonito o Robert Plant e o Jimmy Page dizendo: "quando a gente usava hero�na nossa espiritualidade foi pro buraco". E vai. Se voc� t� quebrando o teu ritmo e tua energia, voc� vai pagar por isso. � espiritualidade zero. Se voc� encher esse copo pela metade, tem gente que vai achar que ele est� quase vazio, mas tem gente que vai achar que ele t� quase cheio. O Kurt Cobain expressava as coisas boas e ruins que ele via no mundo, mas com a droga, n�? Eu acho chato o que aconteceu com o Kurt Cobain, mas tudo aconteceu por um motivo. O chato � que ele � o melhor que apareceu em trinta anos! As m�sicas do cara eram muito boas. Mas o trabalho do Nirvana era muito perigoso, aquilo era querer virar Cristo, ele apanhando de seguran�a no pr�prio show, sou eu apanhando de seguran�a no show do Emerson, Lake & Palmer no Canec�o. Quer coisa mais babaca do que qualquer um apanhar de seguran�a em show do Emerson, Lake & Palmer no Canec�o, meu filho? (risos)

O que voc� falaria sobre drogas oito anos atr�s?

Eu n�o falaria nada, porque eu tinha uma postura t�o contra tudo e contra todos que se voc� me falasse "n�o come isso que � veneno", eu chegava e comia mesmo. Eu sou ariano, eu aprendo dando cabe�adas. A minha serenidade, at� a minha pr�pria inseguran�a, � um dom, porque eu sofri tanto. A quest�o � que eu n�o tinha que tomar droga coisa nenhuma, tinha que tomar na cabe�a. Sai desse canto Renato, p�ra com tadinho de mim. Tadinho de mim? Foda-se! A vida � dif�cil mesmo. Ah, eu sou poeta, artista... Foda-se! N�o vou ficar incomodando os meus amigos. Eu tinha uma postura rebelde, completamente idiota. Eu achava assim: "ah, eu t� destruindo meu pr�prio corpo e ningu�m tem nada com isso".

Voc� renega o seu passado?

N�o, eu n�o renego o meu passado. Se tivesse que fazer tudo de novo, eu faria tudo de novo, porque � da minha personalidade. O legal � que eu aprendi. Tamb�m, morrer de overdose depois dos 27 anos n�o � de bom tom (risos). Ficar que nem o Syd Barret? Eu sou muito mais o Iggy Pop, o cara com 50 anos e arrebentando, falando tudo que queria falar.

Qual � o melhor cinema do mundo e quais filmes te marcaram?

O cinema independente americano � muito bom. Eu gosto muito dessas produ��es independentes de tem�tica gay que t�m aparecido agora. Gosto do trabalho do Todd Haynes, do Gregg Arai, um asian-american (risos), o cinema italiano... Eu acho que o cinema brasileiro t� vindo com uma for�a total, a produ��o de curtas est� muito legal. Tem uma galera fazendo coisas muito legais.

Voc� tem vontade de trabalhar em cinema, algum dia?

Ah, � o meu sonho, fazer roteiro e m�sica tamb�m, mas � mais complicado. N�o sei, planos a gente sempre tem. Como � aquela frase? "Quem mais sonha � quem mais faz". Eu sonho o tempo todo, desde os tempos em que ouvia "Born To Run" do Bruce Springsteen e queria fazer o mesmo com uma superbanda num superpalco. Eu ainda vou ganhar dois Oscar. "And the wineer is... Oh my God, Renato Russo!" (risos). A� eu subo pela lado errado, sabe aquela coisa assim.

Em quais categorias voc� vai levar o Oscar, ent�o?

Dire��o e roteiro. Mas eu ainda n�o decidi se melhor filme estrangeiro tamb�m. E no ano seguinte eu sou convidado para ser presidente do j�ri. Bobagem! Isso tudo s�o sonhos. Mas voltando ao cinema, o australiano est� muito forte. Enquanto houver gente querendo falar, acontece. O que eu t� um pouco emburrado � com o cinema comercial americano. Chegou num ponto em que eu adivinho as hist�rias. � aquele pequeno muno de Hollywood. Se voc� vai pros Estados Unidos � gritante. Eu estive em Nova York agora, e o que t� morrendo gente de AIDS, mas � muita gente, � o holocausto. Todo mundo que trabalha com foto, cinema, etc... Todo mundo! E ningu�m fala sobre o assunto, n�o � como aqui, e a sociedade inteira ignora isso. A televis�o americana � absurda. Mas tem outras cisas boas, a programa��o infantil � muito legal. Ele ficam alimentando as crian�as com essas coisas belas, mas o que vai ser delas quando crescerem? Vira tudo grunge de Seattle! � o Eddie Vedder! Vira tudo doente.

O que te d� prazer hoje em dia?

Ah, tanta coisa. Os meus amigos, a minha fam�lia, trabalhar, cigarro. Cigarro � foda! Eu t� tentando parar mas n�o consigo, eu adoro. Al�m de ser um viciado eu gosto, mas isso n�o conta, cigarro n�o me d� prazer. Bons filmes, bons v�deos, m�sica, muita coisa.

O que s�o bons amigos pra voc�?

� quando voc� encontra uma pessoa que olha na mesma dire��o que voc�, compartilha a vida contigo e te respeita como voc� �. Uma pessoa com a qual voc� n�o precisa ter segredos e que goste at� dos teus defeitos. Basicamente, � aquela pessoa com quem voc� quer compartilhar os bons momentos e os maus tamb�m.

De onde v�m os teus amigos? Eles s�o os mesmos do passado?

Alguns s�o os mesmos e outros n�o. Eu n�o tenho muitos, mas tenho bons amigos. Seu eu contar realmente, n�o devem passar de cinco. Mas tem outros.

Os meninos da Legi�o est�o entre eles?

Sim, mas como a gente tem uma rela��o e trabalho, � diferente. Tem o fato de eu ser gay, e uma dist�ncia que eu coloco. Porque acho o Dado o homem mais gostoso do mundo(risos). E o Bonf� o homem mais gostoso do mundo, entendeu?

Heterossexualmente falando, voc� acredita no chav�o de que homens e mulheres n�o podem ser amigos?

Isso � mais complicado ainda. Existe o momento em que vai pintar a atra��o. Mas tamb�m, quando existe uma amizade plena e o sexo aparece, � um outro tipo de sexo, uma coisa mais de compartilhar. Eu acredito que para haver paix�o voc� n�o pode conhecer a pessoa a fundo, sen�o entram outras formas de se relacionar, sem aquela coisa da paix�o cega e tudo. E na rela��o hetero existem tantas regras que de repente cortam uma naturalidade que h� na amizade. As regras mudam. Mas � t�o complicado. Eu estou vivendo uma rela��o agora com esse cara supergente fina, mais jovem que eu, e a gente n�o tem problema, t� t�o legal.

Ao que parece, voc� � uma pessoa que trabalha muito com limites e regras...

Isso � da minha forma��o. Eu n�o nasci com uma vis�o de saber as coisas como elas s�o. Eu s� vou saber se alguma coisa � quente porque eu conhe�o o frio. Eu me coloco limites. Trabalho muito assim, tem at� um amigo meu que fala: "hum Renato, voc� e suas regras!" Mas, ora bolas, � a minha forma��o, eu sou classe m�dia e regra do come�o ao fim.

A m�sica � um canal pra voc� esquecer essas regras e limites?

N�o, porque eu sou um cara muito disciplinado no trabalho. Existe o momento e cria��o e existe o momento de trabalhar. Tem aquele dia que voc� tem aquela id�ia �tima pra escrever um livro, e depois t�m os dias em que voc� vai escrever o texto, fazer as corre��es. Mas os dois casos s�o interessantes, porque eu gosto do meu trabalho.

O que voc� acha dessa nova onda do punk e a "new wave da new wave"?

Eu acho que n�o � uma coisa da imprensa, acho que � uma coisa da garotada. O punk foi muito importante, e o que � impressionante � perceber que o punk foi mais importante do que eu achava que era. Eu tive sorte de participar, eu t� com 34 anos e tinha 17 em 77. Foi assim: "�ba, t� pra mim". Mudou o mundo pop completamente, de uma maneira que s� os Beatles, os Rolling Stones e a "invas�o brit�nica" conseguiram. Ficou, n�? Deve ter algum motivo porque o Elastica t� fazeno aquele som. O rock'n'roll � isso. Depois do Album (disco do PIL, de 86), o John Lydon n�o pode fazer nada de interessante. Mas o que eu acho impressionante � como as coisas v�o se reciclando. De repente, tentou-se um revival dos sixties, que n�o aconteceu. Mas agora t� vindo com for�a total.

E no Brasil?

No Brasil, a gente t� com uma cena muito legal. � legal que estejam aparecendo tantas bandas novas e que o pessoal das antigas t� dando for�a; os Tit�s com o Banguela e o Dado com o Rock It! (ambos selos independentes). Acho que os Raimundos s�o um sopro de vida. Foi �timo, daqui a pouco vai ter a vingan�a dos Raimundos: os cr�ticos v�o falar mal mas eles v�o continuar fazendo discos, com o seu p�blico e vendendo. Gabriel O Pensador � uma figura superlegal. O Gabriel tem 19 anos! A gente esquece, o cara tem 19 anos! Raimundos � a segunda ou terceira gera��o de Bras�lia!

Quais s�o as suas refer�ncias musicais de brasileiras?

Brasileiras, muito muito mineiro, Beto Guedes e Milton, mais at� do que Caetano. Comprei muito Egberto Gismonti, muito Milton, Clube da Esquina Dois. At� Ronnie Von, tem um disco dele que � t�o bonito, eu vi num sebo outro dia e quase comprei. Mas acabei desistindo de comprar pra n�o me decepcionar. � um que tinha a m�sica que ele fez pra filha dele, era (cantarola) "Alessandra..."(risos). Mas era legal! Mutantes, Rita Lee ouvi at� cansar aquele Fruto Proibido. Foi o primeiro show de rock que eu vi na minha vida. Chico n�, porque Chico era o comunista que toda m�e queria ter como filho. Meu pai comprou Constru��o, ele ouvia �ngela Maria e minha m�e umas coisas mais antigas. O tempo vai passando e eu vou respeitando cada vez mais a m�sica brasileira. Eu era muito esnobe, isso at� a gente entrar pro meio e ver como sofre o m�sico, como funciona essa m�fia do direito autoral, das gravadoras... Esses caras s�o uns her�is.

Levantamos da mesa e Renato nos convidou para uma visita ao est�dio onde estava sendo gravado o novo disco solo, de m�sicas italianas. Antes ele precisava passar num hotel para buscar um amigo italiano que estava no Rio de Janeiro. Enquanto Renato tomava banho, Tereza fazia reservas para o jantar no Enotria, um dos restaurantes mais caros da cidade.

Descemos das escadas do pr�dio de volta ao calor. Flanando pela rua em busca de um t�xi, num passo descompassado, ombros arqueados, Renato Russo usava com sabedoria o disfarce da loucura.

 

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